Archive for Setembro, 2018

AOS 89 ANOS, MORRE ÂNGELA MARIA, O SAPOTI BRASILEIRO

Setembro 30, 2018
Cantora estava internada há 34 dias, no Hospital Sancta Maggiore, em decorrência de um quadro de infecção
por Agência Brasil.
EBC
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Angela Maria, a Sapoti, foi uma das rainhas do rádio e de estrondoso sucesso entre os anos de 1950 e 1960

Agência Brasil – Aos 89 anos, morreu em São Paulo, a cantora Angela Maria. Ela estava internada há 34 dias, no Hospital Sancta Maggiore em decorrência de um quadro de infecção. O velório e o enterro ocorrerão hoje (30) no Cemitério Congonhas. De acordo com a família, foi um período de sofrimento para a artista.

A cantora morreu na noite deste sábado (29). Em um vídeo, publicado no Facebook, Daniel D’Angelo, marido da cantora, Alexandre, um dos quatro filhos adotivos do casal, e um assessor confirmaram a morte e pediram orações. Também afirmaram que jamais deixarão a estrela dela apagar.

Angela Maria, conhecida como a Sapoti, foi uma das rainhas do rádio e de estrondoso sucesso entre os anos de 1950 e 1960, em um vídeo no Facebook. “É com meu coração partido que eu comunico a vocês que a minha Abelim Maria da Cunha, a nossa Angela Maria, partiu, foi morar com Jesus”, disse Daniel D’Angelo.

Vida

Angela Maria, nasceu em Conceição de Macabu, no Rio de Janeiro. Foi operária e teve várias atividades profissionais, mas sempre quis seguir carreira artística. Mas jamais deixou de cantar.

A artista se consagrou na era dourada do rádio, tornando-se uma referência ao lado de Maysa, Nora Ney e Dolores Duran. Recentemente, a cantora disse que gravou 114 discos e vendeu aproximadamente 60 milhões de exemplares.

Em 2012, tentou seguir carreira política. Candidatou-se a vereadora da cidade de São Paulo, mas não se elegeu. Há três anos foi lançada a biografia “Angela Maria: a eterna cantora do Brasil”, escrita pelo jornalista Rodrigo Faour, que reuniu depoimentos e relatos da cantora.

Relembre entrevista de Angela Maria a Colibri Vitta, na Rádio Brasil Atual

Cantora falou coma a RBA dias antes de se apresentar no Sesc Santo André no ano passado. Era o seu primeiro espetáculo acústicoem 65 anos de carreira. Acompanhada pelo violonista Ronaldo Rayol, Angela apresenta canções consagradas do álbum Angela à Vontade em Voz e Violão, entre elas Nunca (Lupicínio Rodrigues),Retalhos de Cetim (Benito di Paula), Só Louco (Dorival Caymmi) e Manhã de Carnaval (Luiz Bonfá e Antônio Maria). A artista conversou com o jornalista Oswaldo Luiz Colibri Vitta por cerca de 15 memoráveis minutos

MOSTRA DE ARTES VISUAIS: COM LICENÇA EU VOU À LUTA, POR ROSÂNGELA VIG

Setembro 29, 2018

do Obras de Artes

por Rosângela Vig

“Eu sou aquela mulher
A quem o tempo
Muito ensinou.
Ensinou a amar a vida.
Não desistir da luta.
Recomeçar na derrota.
Renunciar a palavras e pensamentos negativos.
Acreditar nos valores humanos.
Ser otimista.”
(CORALINA, 2004, p.132)

As palavras seriam insuficientes para descrever a mulher que foi nossa querida Cora Coralina. Seus versos são de infinita simplicidade, mas de imensurável vigor e beleza. As linhas evidenciam a maturidade, a energia, ao mesmo tempo em que expõem o interior de uma alma tão doce quanto os doces que ela mesma fazia.

Nas palavras da poesia estão um pouco da poetisa que encantou, mas acima de tudo, um pouco do pulsar constante do coração de cada mulher em sua obstinada luta diária. E quando os versos não bastam, entra a Arte com suas cores e formas para falar ao coração. E decerto o encantamento se complete pelas demonstrações artísticas, quando tanto se tem a dizer da alma feminina. Possivelmente esse retrato de mulher resoluta, firme e perseverante esteja representado nas obras da exposição que está em cartaz no Mercure Hotel, em São Paulo.

A mostra, que tem a impecável curadoria de Sandra Honors, revela pensamentos, lutas e conquistas femininas em meio a uma sociedade ainda tão desigual. Por meio de diferentes linguagens e técnicas, as artistas, minuciosamente escolhidas, expuseram em suas obras, os enfrentamentos diários, as vitórias alcançadas e as que ainda estão distantes. A mostra teve início em 21 de setembro; ficará até 31 de outubro no Mercure Hotel São Paulo Paulista, da Rua São Carlos do Pinhal, 87, na Cidade de São Paulo; e poderá ser visitada das 10 às 20 horas.

Se porventura a Poesia acima se metamorfoseasse, cada obra da exposição seria uma palavra, seria um verso. Pelas mãos das artistas, ficaram expostas tantas Coras do Brasil em seus mais singelos momentos do cotidiano, expostos na doçura do olhar de mãe, na força de mulher guerreira, no gesto delicado, na voz melodiosa, no olhar resoluto e contundente. Cada qual tem seu próprio encantamento e leveza. Se acaso o espectador se encantar, é porque a Poesia soprou na Arte.

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Obras da Mostra de Artes Visuais “Com Licença eu vou à Luta”. Fotos: Divulgação.

GGN: SAMBISTAS LANÇAM MANIFESTO CONTRA O FASCISMO

Setembro 28, 2018

Foi lançado na manhã desta sexta-feira (28/9) manifesto de artistas, músicos, intelectuais, jornalistas, profissionais, coletivos e grupos ligados ao samba contra o fascismo.

O documento é assinado por Adriana Moreira, Aldir Blanc, Alessandro Penezzi, Aline Calixto, Arismar do Espírito Santo, Bira da Vila, Carlinhos Vergueiro, Chico Buarque de Holanda, Claudio Jorge, Cristina Buarque, Douglas Germano, Eduardo Gudin, Emerson Urso, Fabiana Cozza, Jorge Simas, Kiko Dinucci, Luísa Maita, Martinho da Vila, Maurício Carrilho, Milton Hatoum, Nei Lopes, Nelson Rufino, Nelson Sargento, Noca da Portela, Paulão Sete Cordas, Pedro Amorim, Rappin’Hood, Renato Braz, Toninho Ferragutti, Toninho Geraes, Toninho Nascimento, Yamandu Costa, entre muitos outros.

“O Samba, um dos elementos fundamentais da cultura brasileira, sempre foi porta-voz das lutas pela liberdade e dos anseios do nosso povo.

O fascismo que se expressa na candidatura de Bolsonaro é um perigo que merece o posicionamento de todos e todas nós.

É hora de uma defesa direta e clara de nossa sociedade e cultura.

Não aceitamos o racismo representado por ele!

Não aceitamos o machismo representado por ele!

Não aceitamos a misoginia representada por ele!

Não aceitamos a perda de direitos trabalhistas representada por ele!

Não aceitamos a intolerância religiosa representada por ele!

Não aceitamos o preconceito representado por ele!

Nos posicionamos como brasileiros, artistas criadores, porque nossa origem e nossa arte repudiam o que ele representa!

Bolsonaro é um retrocesso civilizatório e um risco para as futuras gerações brasileiras.”

 

Para acessar a página do manifesto na internet, clique aqui.

Imagens

PORTAL FÓRUM: MORRE LUHLI, A COMPOSITORA DE “O VIRA”, DOS SECOS & MOLHADOS

Setembro 27, 2018

Grande compositora e precursora LGBT, Luhli, de 73 anos, da dupla Luhli e Lucina nos deixou em decorrência de um quadro crônico de asma complicado por pneumonia

Luhli. Foto: Divulgação

Heloísa Orosco Borges da Fonseca, mais conhecida como Luhli, da dupla Luhli e Lucina, nos deixou nesta quarta-feira (27), aos 73 anos. Morreu no hospital Raul Sertã, em Nova Friburgo, região serrana do Rio de Janeiro, em decorrência de quadro crônico de asma complicado por pneumonia.

Duas coisas parecem inacreditáveis neste pequeno parágrafo. A primeira, e mais óbvia, é o fato em si e a segunda é Luhli ter 73 anos. Claro que o tempo passa para todos, e é bom que passe, mas a cantora, compositora e multinstrumentista foi, nas décadas de 70 e 80, um dos grandes ícones da juventude, transformação e ousadia.

Vamos, enfim, do começo. Luhli, que na época era apenas Luli, formava uma dupla musical e também na vida com a cantora e compositora Lucina. E as duas viviam juntas também com o fotógrafo Luiz Fernando da Fonseca, formando um ‘trisal’.

Lucina, Luhli e o fotógrafo Luiz Fernando da Fonseca. Foto: Arquivo Pessoal

Amiga de Ney Matogrosso, foi ela quem apresentou o cantor ao compositor João Ricardo. Os dois acabaram formando o grupo Secos & Molhados.

Difícil imaginar um grupo tão pequeno de pessoas que tenha dado contribuição tão significativa, tanto no comportamento da juventude brasileira quanto na música.

Do antológico disco de estreia dos Secos & Molhados, de 1973, Luhli é autora, ao lado de João Ricardo, de duas canções. Uma delas é, nada mais nada menos do que o maior sucesso do álbum, “O Vira” e a outra é “Fala”, que se tornou uma das mais emblemáticas do período.

No segundo disco do grupo ainda entrou outra parceria dela com João, “Toada & Rock & Mambo & Tango & Etc” que, assim como o álbum, não fez tanto sucesso quanto as anteriores.

A história de Luhli e Lucina é contada no longa-metragem “Yorimatã”, de 2014, dirigido por Rafael Saar.

As duas fizeram inúmeras canções que foram gravadas por um sem fim de cantores da nossa música, como – além de Secos & Molhados e Ney Matogrosso em sua carreira solo – Frenéticas, Nana Caymmi, Tetê e Alzira Espíndolla, Joyce, Rolando Boldrin e Wanderléa.

Cena do filme Yorimatã, de Rafael Saar, com Luhli e Lucina

Luhli, que além de cantora, compositora e instrumentista, era também ogã de umbanda, ilustradora e escritora, publicou poesia, contos, crônicas, romance, optou por levar uma vida retirada.

A dupla foi pioneira, ao lado de Antônio Adolfo, na produção independente de discos e fazia espetáculos quase artesanais.

Nunca explodiu como artista, mas teve uma vida linda e intensa, uma carreira profícua e nos deixa um grande legado.

PORTAL FÓRUM: “MULHERES ESTÃO MOSTRANDO SUA FORÇA”, DIZ LECI BRANDÃO SOBRE CAMPANHA#ELENÃO

Setembro 26, 2018

De acordo com a candidata à reeleição a deputada estadual por São Paulo o #EleNão demonstra a capacidade das mulheres de entender que o momento pede uma reação do eleitorado feminino.

Leci Brandão. Foto: Facebook

De acordo com Leci Brandão (PCdoB), candidata à reeleição como deputada estadual por São Paulo, o #EleNão demonstra a capacidade das mulheres de entender que o momento pede uma reação do eleitorado feminino. “É hora de reagir contra esse ódio. As mulheres estão mostrando sua força”, diz ela.

Leci afirma que, por ser mulher, negra e ter escrito músicas para o segmento LGBT, ela faz questão de mostrar o seu posicionamento em relação à candidatura de Bolsonaro. “Só esses três fatos já fazem com que eu me coloque de uma forma muito clara e muito consciente”, afirma a candidata.

Ela diz também que é preciso que as mulheres que estão na corrida eleitoral se posicionem sobre o assunto. Segundo ela, é preciso ser transparente quando a pessoa decide representar um segmento da sociedade. “A gente tem que dar visibilidade para essas mulheres corajosas. A mulher tem que ser protagonista”, afirma.

Como mais da metade do eleitorado é composto por mulheres, Leci lembra que esse movimento é decisivo para mostrar que é possível uma vitória contra o comportamento e falas do candidato. Além disso, a campanha da candidata tem levado a questão do #EleNão para suas agendas nas periferias e nas redes sociais.

No dia 29 de setembro espera-se uma grande mobilização de mulheres pelo Brasil contra a eleição do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL). Essa reação nas ruas veio da hashtag #EleNão, que começou a circular nas redes sociais e mobilizou artistas, pensadoras e políticas. Até o dia do ato, a Fórum irá entrevistar mulheres que aderiram à campanha.

a eleitoral se posicionem sobre o assunto. Segundo ela, é preciso ser transparente quando a pessoa decide representar um segmento da sociedade. “A gente tem que dar visibilidade para essas mulheres corajosas. A mulher tem que ser protagonista”, afirma.

BEIRANDO A PERFEIÇÃO, POR AQUILES RIQUE REIS

Setembro 25, 2018
por Aquiles Rique Reis
Gravado na Alemanha, tenho comigo um CD de extraordinária beleza: Guinga Invites Gabrieli Mirabassi – Passos e Assovios* (Acoustic Music Records), 19º disco de Guinga e o segundo em parceria com Mirabassi.
Estou certo de que vocês já conhecem Guinga, mas ainda não escutaram Mirabassi, um virtuoso clarinetista italiano, parceiro de alguns músicos brasileiros. E o que os dois tocam é de tal forma genial que chego a cogitar não serem deste planeta.
A valsa “Passos e Assovio” (Guinga e Paulo César Pinheiro) abre o CD. O violão de Guinga toca uma linda introdução. E chega o clarinete de Gabrieli Mirabassi, intenso, sentido. Assim os dois seguem em meio a uma densa harmonia. Logo Guinga improvisa num intermezzo porreta – Gabriele o observa e sente o vigor ali expresso. Mais alguns compassos e, como que revigorados por tanto encanto, clarinete e violão voltam a se superar. A sutileza da melodia puxa a emoção e a mantém alta, do primeiro ao último respiro.
“Odalisca” (Guinga e Aldir Blanc) é outra valsa. Clarinete e violão iniciam. O clarinete sola; o violão segura a harmonia. O frescor da composição atiça os sentidos mais valiosos das harmonias, e elas, as esplêndidas de Guinga, são o som de uma vida.
Nova valsa, “Igreja da Penha” (Guinga), inicia-se com o violão solando a melodia: um tema de rara beleza, marca registrada da obra de Guinga. O clarinete assume a proeza de dar ainda mais belezura ao que já era belo. Suave, a harmonia ampara alguns improvisos do clarinete, ele que brinca de fazer caber muitas notas num só compasso. Na segunda parte o solo é do violão. Logo o clarinete volta com notas ainda mais ternas e, no final, se diverte “enfileirando” notas até que a tampa se feche.
“Ellingtoniana” (Guinga) é um belo samba-canção. O violão se dá a acordes suaves. O clarinete, pedindo passagem para se achegar, vem no sapatinho – seu improviso tem um quê de sublime. E os dois vão unidos, solidários.
“Cheio de Dedos” é o choro de Guinga. Uníssonos de clarinete e violão criam a atmosfera que permeia todo o álbum: uma sonoridade de alto padrão. O clarinete improvisa. O violão o sustenta, e é com ele que o clarinete ganha confiança e se atira de cabeça em busca de mais força e magnitude. Ora vejam, como se isso fosse possível!
A toada “Tangará” é a primeira música do disco para a qual Guinga fez letra, música e cantou os versos – outras letras cantadas por ele virão à frente. Clarinete e voz vão em uníssono. O clarinete trina. O violão vibra. O intermezzo dos dois é quente. A melodia vem em vocalizes. O clarinete volta a trinar… Meu Deus, o que é isso?
Bem, essas são as minhas impressões sobre seis das doze faixas do álbum de Guinga e Mirabassi. Mas estejam certos de que o CD ainda tem muito mais do bom e do melhor de uma música instrumental que beira a perfeição.
Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4
*Pena que até agora o CD físico tenha sido lançado apenas no exterior. Mas é possível ouvi-lo em plataformas digitais como Spotify, Itunes e afins.

BRASIL DE FATO: ENCONTRO DE CULTURAS DE RAIZ EM BELO HORIZONTE (MG)

Setembro 24, 2018

RESISTÊNCIA

O Aldeia Kilombo do Século XXI, que acontece entre os dias 28 e 30 de setembro, agrega culturas negra e indígena

Larissa Costa

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG)

Festival também conta com debates e programação para crianças - Créditos: Foto: Thamires Siqueira e Matheus Sá Motta
Festival também conta com debates e programação para crianças / Foto: Thamires Siqueira e Matheus Sá Motta

Como forma de agregar as culturas negra e indígena, e construir um espaço de resistência, o evento Aldeia Kilombo no Século XXI acontece em Belo Horizonte, de  28 a 30 de setembro. Totalmente gratuita, a programação conta com a presença de mestres populares, professores, capoeiristas, dançarinos afro e crianças de aldeias, quilombos e periferias. O Aldeia, que é organizado pela Associação Cultural Eu Sou Angoleiro (ACESA) e pela Companhia Primitiva de Arte Negra, acontece na rua Aarão Reis, no Teatro Espanca, no Viaduto Santa Teresa e no Parque Municipal, todos no Centro da capital.

Flávia Soares, uma das produtoras do evento, conta que o Aldeia surge a partir da necessidade de grupos culturais que não têm acesso a grandes editais. Ela conta que a ideia é fazer do hipercentro de BH um espaço de convivência e de debate político. “A gente não traz somente um festival, mas um festival seguido de discussões político-culturais sobre as manifestações africana e indígena, que a cada dia têm sido esquecidas pelo poder público”, afirma.

Entre os destaques da programação, estão as rodas de conversa “Dança Afro Brasileira na Cena – Memórias e Caminhos” e “Religiosidades de Matriz Africana e Indígena e Paz Religiosa”. Mestre Conga e Dona Eliza, Mamour Bá, Tambor de Criola Rosa de São Benedito e Uai Sound System são algumas das atrações culturais. No sábado (29), haverá roda de capoeira a partir das 15h. No domingo (30), a festa é destinada às crianças. Mais detalhes sobre a programação aqui.

Edição: Joana Tavares

PORTAL FÓRUM: NÃO SE TRATA DE DAR VOZ, MAS DE OUVIR SUAS VOZES, DIZ AUTORA DO LIVRO ‘MULHER DE FAVELA’

Setembro 23, 2018

Na última quarta-feira (19), Nilza Rogéria de Andrade Nunes, doutora em Serviço Social pela PUC-Rio e mestre em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social pelo Instituto de Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, lançou o livro ‘Mulher de favela: o poder feminino em territórios populares’. A obra é resultado da sua tese de doutorado, “As ‘Marielles’ do Rio – mulheres das favelas que são líderes, cuidam de suas casas e da comunidade”.

O lançamento do livro ocorreu durante o seminário Direitos Humanos em Perspectiva, organizado pelo Centro Cultural Justiça Federal (CCJF). A obra traz o relato de 15 mulheres com protagonismo dentro e fora de suas comunidades. Entre elas, a dona Zica, 84 anos, moradora da Vila Aliança e fundadora do Sindicato das Domésticas do Rio. “Ter poder dentro da comunidade, e poder na comunidade, é você estar em torno daquilo que acontece das questões sociais, pela formação, as questões sociais está em torno da gente”, diz dona Zica, que aos 9 anos foi empregada doméstica, teve seis filhos e abandonou os estudos, voltando às salas de aula aos 40 anos. Aos 82 anos, ela formou-se como assistente social na PUC-Rio.

Confira entrevista exclusiva com a autora do livro:

Fórum – Na obra “Mulher de favela: o poder feminino em territórios populares” você busca compreender o protagonismo crescente das mulheres nas favelas da cidade. Por que e como o protagonismo da mulher tem crescido nesses territórios?

Nilza Rogéria de Andrade Nunes – A participação das mulheres das favelas não é de hoje. No entanto, do ponto de vista histórico, vem se construindo, principalmente, a partir da década de 1980, mas ganha maior impulso após os anos de 1990. No período pós-ditadura, quando os movimentos sociais ressurgem, junto com ele o movimento feminista e movimento de mulheres despontam no Brasil. Nos movimentos de favela isso também ocorre, mas muito protagonizado inicialmente pelos homens. As mulheres entram em cena quando buscam melhorias para esses territórios se organizando por conquistas de creches, em comissões para melhorias do espaço e cursos profissionalizantes. Isso ocorre no período em que há uma “explosão” de ONGs e também das nomeadas organizações de base comunitária (OBC). Essas organizações possuem características próprias por terem uma forte relação com a população onde se inserem. Normalmente, elas são pequenas, já que atuam apenas em âmbito local. São organizações que, antes de tudo, conhecem muito bem o local onde atuam, seus problemas de fato e as pessoas que vivem lá. Seu trabalho está muito mais fundamentado na emergência das questões cotidianas. Tendem a não ser formalizadas e costumam ser generalistas, pois no local os problemas são inúmeros e atuam em diversas pontas. São esses os espaços onde as mulheres atuam principalmente.

Fórum – Quais fatores têm levado as mulheres a se organizarem? Quais dificuldades elas enfrentam?

Nilza Rogéria – Como as políticas públicas são insuficientes nos espaços populares, as mulheres começam a atuar numa luta social e política buscando melhorias para suas comunidades. As associações de moradores acabam ficando mais centradas ao universo masculino, e nas OBC as mulheres assumem mais esse protagonismo. Elas atuam em diversas frentes que são demandadas pelos moradores. Nesse sentido, tem um compromisso de cidade, mas com uma escolha radical pelo território da favela. Saem desses espaços, mas, ao mesmo tempo, não se distanciam dele. Não abandonam as causas, mesmo que as oportunidades as levem a outros vôos. Esse protagonismo da mulher em condição de subalternidade faz com que assumam um papel de referência nos locais onde contraíram e constroem suas histórias. À medida que se engajam nos movimentos sociais, espaços de controle social, passam a circular por diferentes espaços, elas transitam de práticas assistencialistas para práticas emancipadoras, pela via da tomada de consciência política, pela mobilização e participação comunitária. Assim, iniciam suas práticas movidas pelo afeto, pela solidariedade e pela reciprocidade, mas à medida que se engajam nesse compromisso estas mulheres constroem uma dinâmica de movimento, de política e de interesse a partir de proposições e de ações transformadores da realidade. As dificuldades enfrentadas não são poucas. Enfrentam as questões concernentes a sua condição de mulheres e de favela, além de negras, em sua maioria. No entanto, tornam-se referência e ganham um protagonismo à medida que essa consciência e possuem um “devir” com consciência “de si” e “para o outro”, mas numa relação de uma solidariedade horizontal. Assim, no contexto das favelas cariocas, a “feminização do poder” faz despontar o fortalecimento da voz de um sujeito político, marcado pela ausência e/ou insuficiência de políticas públicas preconizadas pela garantia de direitos. O fato de priorizarem questões coletivas sobre o seu tempo individual aponta para um sentido de reciprocidade, marcado pelo prazer e pela realização de conquistas em troca de um reconhecimento pelo seu valor como pessoa de referência no seu local de moradia, o que lhe confere um lugar de poder e de visibilidade.

Fórum –  Como se deu a escolha dessas 15 mulheres que foram entrevistadas?

Nilza Rogéria – Procuramos cobrir todas as regiões da cidade e assim buscamos favelas que fossem simbólicas nesse contexto, mas sem perder de vista pequenos e grandes complexos. Por minha atuação em quase 30 anos trabalhando nesses territórios populares, minha rede de contatos é expressiva. Assim, pude identificar algumas com as quais eu tinha conhecimento à priori de sua atuação e as demais foram identificadas através dessa rede de contatos. Nesse sentido, cobrimos a cidade e com uma atuação plural. As favelas/mulheres que fizeram parte da composição desse estudam foram das seguintes localidades: Complexo do Alemão, Maré, Rocinha (grandes complexos); Providência e Morro dos Prazeres (Centro); Chapéu Mangueira (zona sul); Rio das Pedras, Vila Vintém e Vila Aliança (zona oeste); Morro do Urubu, Salgueiro, Borel, Macacos, Serrinha, Pedreira (zona norte).

Fórum – Marielle foi brutalmente assassinada. Como você vê o risco para essas mulheres da favela que lutam? O que é preciso fazer para as mulheres das favelas levarem sua luta para fora desses territórios e poderem ser ouvidas?

Nilza Rogéria- Continuarem na luta! Não há outro caminho a não ser fazer com que suas vozes sejam ouvidas! Não se trata de dar voz, se trata de ouvir suas vozes!! Essas 15 mulheres, iconográficas, representam outras tantas que agora queremos descobrir ou evidenciar. Nossa pesquisa agora em curso é identificar 300 mulheres que atuam em 300 favelas, buscando enfrentar todas as adversidades em prol de uma melhor condição de vida e de saúde para os moradores que aí residem. As vozes destas 15 mulheres, através de seus testemunhos, narram e desenham outra forma de exercitar uma práxis política, que transforma suas inquietudes em pontes, articula e conecta diferentes possibilidades de ação.

Falas marcantes

Nilza Rogéria separou algumas respostas que mais a marcaram durante a construção do livro, em conversas com as “Marielles”. Elas falaram sobre o que é ter poder. Confira os trechos selecionados pela autora:

“Esse poder que eu tenho, essa legitimidade que eu tenho, foram conquistados pela maneira como eu lido com esse trabalho, a maneira como eu acredito nesse trabalho, como eu me doo para esse trabalho. Tem uma doação também nesse processo e eu acho que é muito cômodo para muitas pessoas não trabalhar o seu poder interno, a sua capacidade de agir na realidade, de se colocar. É muito mais fácil, às vezes, você ser passivo diante das coisas (…) Pra mim, o poder não é uma coisa que está fora, é uma coisa que está dentro e ele é exercido a todo momento.” Eliana.

“Para ter poder é preciso ter muita força. O poder é uma coisa tão forte que ele pode servir para o bem e pode servir para o mal. Quando você é uma pessoa consciente, ele serve para o bem e quando você não tem vaidade, nem tem egoísmo. Agora, o poder, quando você é uma pessoa vaidosa, egoísta, ele já aí já não serve… Então, eu acho que poder, às vezes, para em mãos erradas. O poder é uma balança que o tempo todo está assim, tem os altos e baixos e  preciso saber viver com esse poder.” Lúcia.

“O poder é algo muito difícil de mudar, ainda mais no meu lugar de fala, de mulher negra, poucas mulheres negras experimentam o poder. É muito difícil você ver uma mulher negra ser respeitada ou quando ela é respeitada ela sai do papel de negra, finge que não é negra, é uma relação de conveniência. Eu não finjo que não sou negra, a minha pele pode até não ter a coloração que as pessoas gostariam, mas eu nasci de um ventre negro, então eu tenho que ter orgulho disso.” Flávia.

“Eu acho que ter poder é você ter dignidade, ter a cabeça erguida, e também ter a sua vida envolvida. Ter poder dentro da comunidade, e poder na comunidade, é você estar em torno daquilo que acontece, das questões sociais. Pela formação, as questões sociais estão em torno da gente. Ter poder é você ser respeitada nisso, mas não adianta você fazer uma interferência, se você não é respeitada.” Zica.

“Se as comunidades hoje estão nesse pé de guerra, nessa luta, nesse mata-mata, nesse troca-troca, mata esse pra aquele sobreviver, é por que existe lá em cima na cadeia toda uma estrutura podre, safada, que tem o poder de manipular esse país. Sem consciência política ninguém faz nada.” Elizia.

OS 50 ANOS DE ‘PEDAGOGIA DO OPRIMIDO’, E O LEGADO AMOROSO E LIBERTADOR DE PAULO FREIRE

Setembro 23, 2018
EDUCAÇÃO CRÍTICA
Para o diretor-pedagógico do instituto que leva o nome do pensador brasileiro, seu mais famoso livro trouxe uma nova visão para a perspectiva opressor e oprimido, e na relação entre professor e aluno
por Luciano Velleda, da RBA.
DIVULGAÇÃO/INSTITUTO PAULO FREIRE
Paulo Freire

Paulo Freire dizia que ‘a palavra abre a consciência’ e, com ela, incomodou e ainda incomoda os opressores do povo

São Paulo – Paulo Freire estava no exílio no Chile, em 1968, trabalhando no Instituto Chileno para a Reforma Agrária (ICIRA), quando lançou Pedagogia do Oprimido. O livro viria a ser a grande obra da vida do educador e pensador, traduzido para diversas línguas e revelando a gênese do pensamento freiriano ao esmiuçar as relações entre opressores e oprimidos e, a partir daí, sugerir a emancipação do indivíduo por meio do pensamento crítico e libertário. 

Patrono da Educação Brasileira, doutor honoris causa por 27 universidades, seu trabalho é considerado “Patrimônio Documental da Humanidade” pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Para marcar a data do seu aniversário – Paulo Freire completaria 97 anos no último dia 19 de setembro – e celebrar os 50 anos de publicação da Pedagogia do Oprimido, o instituto que leva seu nome planejou a “Semana Paulo Freire”, com vídeo-aulas de Moacir Gadotti, Mário Sérgio Cortella, Carlos Rodrigues Brandão, José Eustáquio Romão, Paulo Roberto Padilha, Ângela Biz Antunes, Francisca Pini, Sônia Couto e Sheila Ceccon. 

“A educação não resolve tudo, mas tudo passa pela educação. Ela tem muito a contribuir para uma sociedade mais justa, mais equânime, para um mundo mais sustentável, uma vida mais feliz. É isso que nós trabalhamos em todos os projetos que fazemos”, afirma Paulo Roberto Padilha, diretor-pedagógico do Instituto Paulo Freire. 

Nessa entrevista à RBA, Padilha fala sobre a influência de Paulo Freire na educação mundial, a importância e atualidade da sua obra para o Brasil conflagrado de 2018, faz ponderações sobre o processo de “demonização” do pensamento freiriano em certos setores da sociedade brasileira, e explica quais são os caminhos para manter vivo e atuante o seu legado.   

Qual a importância do livro Pedagogia do Oprimido 50 anos depois do seu lançamento? 

É um livro emblemático, que estabelece as bases do pensamento do Paulo Freire na relação opressão e oprimido. Um livro que chegou a todo mundo rapidamente e que, nestes 50 anos, foi traduzido para inúmeras línguas. Ele traz uma nova visão de mundo, de relações humanas, sobretudo na perspectiva opressor e oprimido, e também na relação pedagógica entre professor e aluno. Traz a novidade da relação humanizada, para superar a desumanização de uma educação que ele chamou de “bancária’. 

O livro segue sendo atual para a realidade do Brasil e do mundo? 

Nós que pesquisamos Paulo Freire e seu legado, não somos discípulos nem seguidores, puramente. Discípulo é aquele que segue cegamente. Nós não, a gente pesquisa a obra, e ao pesquisar a obra, a cada leitura, descobre e redescobre sua atualidade, mas não só para o momento presente. Ele é um guia e uma inspiração para a educação do futuro.

Muitos dizem que o livro é muito crítico — e ele é um livro crítico —, mas no sentido amargo da palavra, mas não: ele diz que a relação com o oprimido é feita e construída por ele. E estimula fundamentos básicos para a vida humana, como o diálogo, a amorosidade, a humanização, a interatividade. São várias palavras que, na leitura desse livro, você vai percebendo como ele é atual.

O capítulo quatro do livro, que é um dos mais importantes, fala da teoria da ação antidialógica e da ação dialógica, mostra como essa dominação do opressor contra o oprimido acontece, por meio da tentativa de conquista permanente de um pelo outro, da divisão para manter a opressão, dividir para enfraquecer, da manipulação através dos meios de comunicação de massa, dessa invasão cultural permanente que é uma forma de penetrar na cultura do outro impondo sua lógica, sua visão de mundo, quase cancelando a visão do oprimido e sua própria cultura.

Então, ele propõe, nos anos 60, algo que hoje, com a atual crise internacional e brasileira, a gente vê que é muito necessário nos dias atuais. Por isso que nos inspira, nos remete a perspectiva da ação dialógica, que exige a colaboração, a união com as pessoas, a organização coletiva, respeito a adversidade, assuntos que são tratados hoje, respeito às diferenças, às todas as etnias, todas religiosidades, sexualidades, faixas etárias. Então Paulo Freire é atual porque ele respeita a pessoa, a dignidade humana. 

Paulo Freire é uma referência para muitos, mas também desperta críticas de outros tantos. A que se deve isso? 

Ao contrário do que muitos dizem, ele jamais poderia ser um doutrinador, ou querer destruir a educação brasileira, como temos escutado em algumas mídias ou nas redes sociais, por gente que certamente desconhece Paulo Freire. Pelo contrário, ele era um humanista cristão, por conta da sua perspectiva de inclusão, de dignidade, em tentar fazer com que a educação não reproduzisse o que a sociedade tem feito historicamente.

Por isso que, depois de 50 anos, é um livro muito atual, prazeroso de ler, convida sempre a uma reflexão sobre o que acontece no mundo. E fala que antes de qualquer projeto humano, temos que ler a realidade, conhecer para depois intervir. 

Como se chegou a essa espécie de “demonização” de sua obra e pessoa, vigente em alguns setores da sociedade? 

Isto tem muito a ver com o que está acontecendo no país hoje. Vivemos num Estado de exceção, num Estado em que a liberdade de expressão ainda é permitida, mas com restrições, sobretudo nesse processo político de eleições, no acirramento de forças de direita e extrema-direita.

Paulo Freire foi, enquanto cidadão, fundador do PT, e o PT foi demonizado nos últimos anos, a partir do golpe contra a presidenta Dilma, a prisão de Lula. Então há um contexto, com meios poderosos de comunicação de massa comprometidos com os opressores, comprometidos com a sociedade injusta. Eles constroem uma lógica e plantam o acirramento da intolerância. Então a intolerância acaba sendo, para eles, algo positivo.

E diria mais, a população brasileira acabou não se educando politicamente, como nós gostaríamos. A própria escola foi abandonada, o analfabetismo de 11 milhões de brasileiros está inerte. De 7,2% da população em 2017, o Brasil continuou com 7% em 2018 – menos de 300 mil pessoas foram alfabetizadas em um ano.

A lógica da cultura sendo destruída, abandonada. Todas as ações do atual governo são um conjunto de medidas que negam o direito e fragilizam ainda mais os ‘esfarrapados do mundo’, como diria Paulo Freire. 

O pensamento libertário de Paulo Freire incomoda o sistema dominante? 

É claro que quando você tem uma teoria super consistente e que coloca na mesa a situação concreta em que as pessoas vivem, de opressão, e incentiva que elas reflitam, pensem sobre sua vida, sua existência, sobre as relações humanas e de trabalho injustas, é claro que os poderosos e os opressores não querem que isso venha à tona.

Então acabam demonizando e estimulando inclusive a violência, a intolerância. Paulo Freire falava que o “conflito é necessário à educação”, mas não é possível dialogar com quem é intolerante e não escuta. Só mesmo o processo de educação de médio e longo prazo seria capaz de reverter essa história. Claro que temos diante de nós o capitalismo, o neoliberalismo, as potências mundiais, o poder econômico, onde poucas corporações ditam as regras da política.

Então hoje os políticos também estão submetidos, rendidos e vendidos a essa lógica antidialógica que não contribui em nada para que figuras como Paulo Freire sejam valorizadas, como são no mundo inteiro. Mas aqui no Brasil, por conta dessa lógica reacionária, não interessa aos poderosos e a quem se alimenta da opressão. 

Como diria Paulo Freire, “a palavra abre a consciência”, coloca em risco o status quo, as condições do presente, onde os benefícios são sempre para os mesmos. Então estamos num Estado de exceção que tem reflexos diretos na educação, mas nem assim a gente se sente vencido ou enfraquecido, porque a gente percebe a força e a capacidade da obra de Paulo Freire. Se diz que a crise gera oportunidade… Paulo Freire diria que a “crise gera gravidez”, a gravidez de ideias, perspectivas e propostas. Então estamos muito desafiados hoje a buscar alternativas e soluções. 

Depois de Pedagogia do Oprimido, Paulo Freire escreve Pedagogia da Esperança. Como foi essa evolução em seu pensamento? 

As bases do seu pensamento estão no seu primeiro livro, que se chama Educação e Atualidade Brasileira, publicado em 1959. Então ele vem, reiteradamente, denunciando a existência de opressores e oprimidos; ele retoma depois de vinte anos as teses da Pedagogia do Oprimido e escreve a Pedagogia da Esperança, faz críticas. Pega a questão da conscientização, muito valorizada na Pedagogia do Oprimido, e diz que só ela “não dá conta”, que a conscientização precisa vir associada a “ação transformadora”.

A partir do momento em que eu acabo conquistando uma consciência crítica, parto da consciência crítica para uma consciência científica, mas não basta também, tem que ter uma consciência política e transformadora, transcendo essa análise objetiva da sociedade, e faço uma análise da cultura, da sensibilidade. Paulo Freire acreditava em Deus, um humanista cristão que era capaz de juntar numa mesma imagem Cristo e Lenin, essa junção complementar. Paulo Freire, em suas publicações posteriores, discute a ecologia, a sustentabilidade, questiona a destruição da natureza.

Quais alternativas existem para, em 2018, tentar pôr em prática o pensamento freiriano? 

Lembro de alguns neologismos que Paulo Freire criou, como “esperança sem espera”, porque não basta ter esperança, tem que partir para a ação. Ou “paciência impaciente”, que quer dizer que a sua paciência tem limite. Quando se trata da injustiça, da ofensa e degradação humana, nós temos que reagir, resistir.

E como alternativa de mudança desse contexto atual, nós no Instituto Paulo Freire e em várias partes do mundo, estamos resistindo bravamente, dando ênfase aos 50 anos da Pedagogia do Oprimido e, ao fazer isso, a gente também revive a história da educação crítica brasileira, da educação popular e cidadã.

Estamos lançando agora Reiventando Freire, com 63 artigos de freirianos e freirianas do mundo, todos eles falando do que fazemos há 27 anos no Instituto, onde temos estimulado todas as instâncias e modalidades de educação a estudarem Paulo Freire e pesquisar a partir da sua obra. 

Neste livro, o Mário Sérgio Cortella diz que “Paulo Freire não está morto, está sempre presente”, nos inspirando no presente. O artigo do Cortela chama-se Utopias e Esperanças, a utopia desse autor tão importante ser valorizado e respeitado no Brasil, não ser ofendido como tem sido, numa perspectiva violenta e intolerante.

Falta então a gente conquistar mais universidades, tem muito pouca presença de Paulo Freire nas universidades, mas a gente tem nesses anos todos de trabalho alcançado muita gente pelo Brasil, muitos projetos. 

Como vai ser a Semana Paulo Freire? 

É uma semana em que a gente discute, por sete dias seguidos, o livro Pedagogia do Oprimido com Moacir Gadotti, Mário Sérgio Cortella, Carlos Rodrigues Brandão, José Eustáquio Romão e vários educadores do Instituto fortalecendo esse legado.

A gente comemora e aproveita pra mostrar para as pessoas que pouco conhecem Paulo Freire, que ele não era um cara rançoso, vingativo, muito pelo contrário, ele jamais seria, na sua perspectiva teórica e prática, um doutrinador, como vimos a imprensa noticiar. Paulo Freire fala de amorosidade, de felicidade, justiça, superação da opressão, fala de tolerância. Como alguém que fala de tolerância pode plantar a guerra? A gente quer a humanização dos homens, e as escolas ainda têm trabalhado na perspectiva da desumanização. 

Paulo Freire fala, na Pedagogia do Oprimido, que o diálogo “não impõe”, “não domestica”, “não vive de slogans”. E nós vivemos tempos de slogans que são facilmente repetidos, sem reflexão, sem consciência crítica. E a gente planta outra perspectiva, a da educação continuada, em que se educa a vida inteira, uma escola que não desvaloriza o estudante, pelo contrário, onde ele tenha o direito, ao contrário do que diz a “Escola sem Partido”, a reforma do ensino médio, muito frágil na perspectiva curricular.

Chamo isso de uma educação que parte da cultura da pessoa e permite que suas subjetividades estejam presentes no diálogo, e então a gente define o diálogo da cultura com a educação, da educação com a ciência, da ciência com a política. 

Paulo Freire tem mais reconhecimento no exterior do que no Brasil? 

No livro Reiventando Freire, Martin Carnoy escreve o artigo “Paulo Freire continua relevante para a educação dos Estados Unidos”. Ele diz que até hoje, quando se fala em Paulo Freire nos Estados Unidos, num simpósio, num seminário, há muito interesse em participar, as pessoas ainda são ávidas em entender e conhecer o que ele escreveu.

A gente recebe no Brasil comitivas da África, da Europa, dos Estados Unidos, da Ásia, como Japão e China, até porque a Pedagogia do Oprimido foi publicada nessas línguas todas. O Paulo Freire ainda é mais valorizado fora do Brasil do que no Brasil. Por essa razão, desde 1998 a gente realiza encontros internacionais, o primeiro foi em São Paulo, depois já passou por oito países, até chegar neste de agora, na Colômbia, o 11º Encontro Internacional.

Participam, em média, nestes encontros, de 15 a 20 países, que desenvolvem trabalhos e pesquisas na educação. Esse evento na Colômbia tem o desejo de fortalecer lá o legado freiriano, que tem sido pouco trabalhado na América Latina, com exceção do Brasil. Temos sede no Chile, agora na Colômbia, na Argentina, temos pessoas associadas a nossa rede UniFreire, de mais de 100 países.

BRASIL DE FATO: MOVIMENTO TRANSBORDA OCUPA ESPAÇOS NO RMR E AGRESTE COM PROGRAMAÇÕES CULTURAIS

Setembro 21, 2018

Projeto do SESC discute impacto da cultura com mesas de conversas, apresentações de e oficinas

Redação

Brasil de Fato | Recife (PE)

Durante os três meses de Transborda, a programação contempla ações nas unidades e em espaços públicos - Créditos: Jonas Alcantara/Divulgação
Durante os três meses de Transborda, a programação contempla ações nas unidades e em espaços públicos / Jonas Alcantara/Divulgação

Com capacidade de abarcar projetos, o Transborda dá continuidade a sua segunda edição em Pernambuco. Após início da programação com o Transborda Capiba, do Sesc Casa Amarela, outras unidades da Região Metropolitana do Recife e do Agreste vão levar atividades culturais, até novembro, para vários espaços com preços populares. As entradas custam R$ 20 e R$ 10 (meia). A programação completa está no site http://www.sescpe.org.br.

O Transborda, do Sesc, traz apresentações de teatro, dança, música e circo, exposição de arte e rodas de conversas. “Queremos refletir sobre a tarefa de mensurar o impacto da cultura das artes na economia do país e, além disso, levantar questões como acessibilidade e formação de públicos direcionado ao processo de aproximação da população da cena artística”, explica a coordenadora do projeto, Rita Marize.

Nesta edição, o projeto fortalece a sua grade e inova seu olhar sobre o setor ao se conectar com projetos conceituados desenvolvidos por mais outras cinco unidades do Sesc: Transborda – Na Onda da Dança (Piedade), Transborda – Diálogos das Manifestações Populares (São Lourenço da Mata), Transborda – CIT (Santo Amaro), Transborda – Usina Teatral (Santa Rita) e Transborda Mostra Pesqueira (Pesqueira).

Durante os três meses de Transborda, a programação contempla ações nas unidades e em espaços públicos, aumentando sua proximidade com a população, se integra ao programa Cena Expandida e aos projetos Câmbio Festival Internacional de Teatro de Pernambuco, Festival de Teatro do Agreste (Feteag), Teatro Experimental de Arte, em Caruaru, até chegar ao Cena Cumplicidades.

Destaques na programação

São muitas atividades, em diversos locais e municípios. A exemplo da Usina Teatral (Santa Rita) o evento acontece de 21 a 28 de setembro e vai realizar oficinas, mesas de conversa e espetáculos. Entre os convidados, está José Celso Martinez Corrêa, um dos maiores nomes do teatro brasileiro. Tendo como tema “Políticas do Intangível: o teatro sob (im)pressão”, o projeto conta com o apoio da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e do Centro de Formação e Pesquisa das Artes Cênicas Apolo-Hermilo. Durante os oito dias de programação, serão apresentados ao público 12 espetáculos com grupos representantes do Nordeste, que serão encenados no Sesc Santa Rita e nos teatros de Santa Isabel, Apolo e Hermilo Borba Filho, além de espaços abertos, como o Cais do Imperador. Haverá, ainda, mesas de conversa, lançamento de livros, baile temático, conferências e ações formativas com encenadores de todo o país.

A abertura acontece nesta sexta, dia 21, às 19h30, no Sesc Santa Rita, com apresentação do musical “Ritmo Kente”, da companhia Onze Produções, que traz à cena o universo peculiar do brega pernambucano. Logo após a encenação, no Salão de Eventos da Unidade, começa o Baile Ritmo Kente, com Kelvis Duran e Banda Ovelha Negra. Já entre as montagens, estão “Nuestra Senhora de las Nuvens”, do grupo Clowns de Shakespeare; “A invenção do Nordeste”, do Grupo Carmin, ambos do Rio Grande do Norte; e “Dinamarca”, do Grupo Magiluth, de Pernambuco. O evento terá também uma Mostra Pedagógica, com espetáculos de grupos de teatro formados por alunos da UFPE e de unidades do Sesc no estado.

Serão realizadas mesas de conversa e conferências. Uma delas é “O teatro no Brasil ainda é possível?”, com José Celso Martinez Corrêa. O encenador tem uma longa trajetória nos palcos desde a década de 1950 e se tornou conhecido pela montagem do texto “O Rei da Vela”, de Oswald de Andrade, além de comandar o Teatro Oficina Uzyna Uzona. O encontro será no Sesc Santa Rita no último dia do Usina, 28 de agosto, a partir das 18h.

Edição: Catarina de Angola