Archive for Julho, 2019

URARIANO MOTA: CEM ANOS DE PRIMO LEVI

Julho 31, 2019

Cem anos de Primo Levi

por Urariano Mota

O maior narrador que já houve sobre o Holocausto nasceu na Itália em 31 de julho de 1919. De lá até a sua morte em 1987, em circunstâncias até hoje não esclarecidas, pois não é certo se cometeu suicídio, se caiu por desmaio do terceiro andar do apartamento onde morava,  ou se foi morto por fascistas, Primo Levi muito escreveu. Mas de todos os seus livros e textos, o principal é mesmo “È isto um homem?”, que tenho ao meu lado agora. Nele, o escritor faz uma narração imortal pela capacidade de unir o particular da sua história em Auschwitz ao universal da espécie humana. 

Isso posto, observo de passagem que primeiro lemos um livro por necessidade irresistível de humanização. Depois, ao penetrar no humano que poderemos ser, lemos para apreender a vida de que apenas desconfiávamos existir. E mais adiante, lemos para aprender lições que nos iluminem em nossa própria caminhada. Começo então pelo fim, pelas lições aprendidas na leitura de Primo Levi. 

Na primeira delas, aprendemos que a memória é uma compreensão da realidade. E no escritor, em geral, a memória é a própria compreensão do mundo. Aquilo que vimos em “Memórias do Cárcere” de Graciliano Ramos, quando o “paraíba”  nos revelou magistral a prisão política no Estado Novo e dessa narração fez a sua maior obra, em Primo Levi temos fortalecida a estranha descoberta, a saber, que escritores são melhores quando escrevem sem pretensiosa fantasia. E neste momento me acode a basilar referência do capítulo Massangana, de Minha Formação, de Joaquim Nabuco, o primeiro embaixador brasileiro em Washington. Mas não nos percamos.  

No mundo revelado, ou em processo de revelação, da memória para entender a vida, no que ela possui da desgraça para todos nós, ou da rara felicidade, menos vivida que sonhada, esse passo todos nós temos por experiência. Mas agora vem a segunda lição. É natural que não alcancemos a compreensão da vida que lembramos.  Isto é, a maioria não tem consciência da memória que reside no seu ser. Ou até mesmo nem deseja ter essa consciência, quando a memória é trauma, o que vale dizer, quando a memória atinge o limite da abjeção do que passamos. 

Então entro no “É isto um homem?” de Primo Levi.  Como é bem escrito! A dor trafica nas suas páginas com a melhor literatura como se fosse um tráfico sem troca e sem ênfase. Isso quer dizer: numa versão mais dura que a escolha de João Cabral de Melo Neto, quando o poeta fala que o verso  não deve perfumar o perfume da flor, Primo Levi escreve:

“O enfermeiro aponta as minhas costelas ao outro, como se eu fosse um cadáver na sala de anatomia; mostra as pálpebras, as faces inchadas, o pescoço fino; inclina-se, faz pressão com o dedo em minha canela, indicando a profunda cavidade que o dedo deixa na pálida carne, como se fosse cera. 

Desejaria não ter falado ao polonês; parece-me que nunca sofri, na minha vida toda, insulto pior. O enfermeiro acabou sua demonstração, em sua língua que não entendo e que soa terrível; dirige-se a mim e, em quase alemão, compassivamente, fornece-me uma síntese: – Tu judeu liquidado, tu em breve crematório, acabado”. 

Walter Benjamin em uma de suas iluminações escreveu que eram cada  vez mais raras as pessoas que sabiam narrar devidamente. Que ao se pedir num grupo que alguém narrasse alguma coisa, o embaraço se generalizava. Isso parecia que estávamos sem uma faculdade antes certa e inalienável: a faculdade de intercambiar experiências. A transmissão da experiência, notou  muito bem Walter Benjamin, não se realizava na imprensa, pois todas as manhãs recebemos notícias de todo o mundo, e, no entanto, somos pobres em histórias surpreendentes. A razão era que os fatos já nos chegavam acompanhados de explicações (e até mentiras e deformações, acrescentamos no Brasil de hoje). Em outras palavras: quase nada do que acontecia estava a serviço da narrativa, e quase tudo estava a serviço da informação. Péssima informação, fake news, acrescento, pois Walter Benjamin não viveu a imprensa brasileira destes dias.  

É claro, que já antes, mas agora mais que nunca, a experiência para ser transmitida a todos  precisa da literatura. No mesmo passo em que a literatura precisa de modo avassalador, bocarra insaciável, da experiência humana. Sob pena de perecer como a folha do jornal de ontem. A vida sofrida em campo de concentração – não fosse uma experiência monstruosa – carecia de ser narrada além das fotos inumanas dos corpos empilhados em Auschwitz. Se comparo mal, muito mal, a memória do escritor é um impresso sem pauta. Então, como poderia aparecer no jornal a página de Primo Levi que escreveu o que não saberia dizer a ninguém? Diria um editor: “Se ele próprio não sabe o que escreve, imagine o nosso leitor…”. 

A razão disso não é técnica, é avessa a oficinas de literatura. Está fora de qualquer manual de redação dos jornais. Trata-se de falar o que não é falável. Como assim?  No livro “É isto um homem?, são muitos os trechos que poderiam ilustrar o indizível. Com verdadeira violência, consigo retirar estes: 

“Pannwitz é alto, magro, loiro; tem olhos, cabelos, nariz como todos os alemães hão de tê-los, e está sentado, formidável, atrás de uma escrivaninha cheia de papéis. Eu, Häftling 174517, estou de pé em seu escritório, que é realmente um escritório, reluzente, limpo, bem-arrumado; tenho a sensação de que, se tocasse em qualquer coisa, deixaria uma marca de sujeira. 

O Dr. Pannwitz termina de escrever e olha para mim…. 

Quando tornei a ser um homem livre, desejei encontrá-lo outra vez, não por vingança, só por uma curiosidade minha quanto à alma humana. Porque esse olhar não foi cruzado entre dois homens. Se eu soubesse explicar a fundo a natureza desse olhar, trocado como através do vidro de um aquário entre dois seres que habitam dois meios diferentes, conseguiria explicar a essência da grande loucura o Terceiro Reich”. 

“Em termos concretos, essa história restringe-se a bem pouco: um operário italiano me trouxe um pedaço de pão e os restos de suas refeições, cada dia, durante seis meses; deu-me de presente uma camiseta cheia de remendos; escreveu por mim um cartão-postal à Itália e conseguiu resposta. Por tudo isso não pediu nem aceitou compensação alguma, porque ele era simples e bom e não pensava que se deve fazer o bem a fim de receber algo em troca”. 

“Evitar a seleção para a morte, para o gás, é bem difícil. Quem não pode, procura defender-se de outra maneira. Nas latrinas, nos lavatórios, mostramos um ao outro o peito, as nádegas, as coxas, e os companheiros nos animam: – Fica tranquilo, não vai ser a tua vez … Ninguém nega aos outros essa esmola; ninguém está tão seguro da sua própria sorte que possa animar-se a condenar os demais. Eu também menti descaradamente ao velho Wertheimer; disse-lhe que, se o interrogassem, respondesse ter 45 anos e que não deixasse de se barbear na noite anterior, ainda que isso lhe custasse um quarto da ração de pão”. 

“Agora, todo o mundo está raspando com a colher o fundo da gamela para aproveitar as últimas partículas de sopa; daí, uma barulheira metálica indicando que o dia acabou. Pouco a pouco faz-se silêncio. Do meu beliche, no terceiro andar, vejo e ouço o velho Kuhn rezando em voz alta, com o boné na mão, meneando o busto violentamente. Kuhn agradece a Deus porque não foi escolhido para a morte. Insensato! Não vê, na cama ao lado, Beppo, o grego, que tem 20 anos e depois de amanhã irá para o gás e bem sabe disso, e fica deitado olhando fixamente a lâmpada sem falar, sem pensar? Não sabe, Kuhn, que da próxima vez será a sua vez? Não compreende que aconteceu, hoje, uma abominação que nenhuma reza propiciatória, nenhum perdão, nenhuma expiação, nada que o homem possa fazer, chegará nunca a reparar? 

Se eu fosse Deus, cuspiria fora a reza de Kuhn”.       

Aqui, neste vídeo, Primo Levi retorna ao lugar que narrou para sempre em seu  livro 

 

LETRAS POLITIZADAS E SOM “MAIS URBANO” MARCAM O SEGUNDO ÁLBUM DA BANDA PIETÁ

Julho 31, 2019
RECADO INCONTIDO
No programa “Hora do Rango”, grupo fala sobre os caminhos do disco recém lançado, “Santo Sossego”
    
FRANCISCO COSTA/DIVULGAÇÃO

Músicos e atores, Frederico Demarca, Juliana Linhares e Rafael Lorga formam a Pietá

São Paulo — A banda Pietá é a convidada desta quarta-feira (31) do programa Hora do Rango, a partir do meio-dia, na Rádio Brasil Atual. O trio formado por Juliana Linhares (voz), Frederico Demarca (violões) e Rafael Lorga (bateria) acaba de lançar o seu segundo álbum, Santo Sossego. No disco, o grupo aposta em letras engajadas e uma sonoridade contundente, com sintetizadores e guitarras plugadas, ao contrário da atmosfera acústica do álbum de estreia, Leve o que quiser, lançado em 2015. O som mais cru e urbano, entretanto, ainda abre espaço para momentos em busca da tranquilidade de viver em meio ao caos da vida agitada.

“Nós buscamos brincar com espiritualidades abertas, com um tipo de dramaturgia que tangencia esse lugar, mas traz absolutamente outros espaços”, explica a vocalista Juliana Linhares. O novo disco tem as participações dos cantores Josyara, Ilessi, Livia Nestrovski, Khrystal e Caio Prado.

Pietá surgiu em 2012, oriunda do encontro dos músicos Frederico Demarca, Rafael Lorga e da cantora Juliana Linhares. Também atores, o trio se conheceu na faculdade de teatro e decidiu se reunir para “fazer um som”. Ancorados no canto de Juliana Linhares, apontada como uma das grandes vozes da nova geração da música brasileira, a banda mistura a tradição e o popular, ritmos regionais nordestinos com o samba e a literatura. 

No novo álbum, a faixa Suçuarana, por exemplo, homenageia a força da mulher, enquanto em Jabaculê, o tema é a moral conservadora, incluindo um trecho de Evangelho segundo Jesus, peça estrelada pela atriz trans Renata Carvalho e censurada em alguns teatros em 2018.

O programa

Hora do Rango, apresentado por Colibri Vitta e premiado pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA), recebe ao vivo, de segunda a sexta-feira, ao meio-dia, sempre um convidado diferente com algo de novo, inusitado ou histórico para dizer e cantar. Os melhores momentos da semana são compilados e reapresentados aos sábados e domingos, no mesmo horário.

ARMAZÉM DO CAMPO É REFERÊNCIA DA CULTURA DE RESISTÊNCIA

Julho 30, 2019

PROGRAMAÇÃO

Todo mês são realizados mais de dez eventos gratuitos, com artistas de diversos estilos

Geanini Hackbardt

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG)

30 de Julho de 2019.

Loja do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) da capital mineira foi inaugurada em novembro de 2016 - Créditos: Foto: Joyce Fonseca/MST
Loja do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) da capital mineira foi inaugurada em novembro de 2016 / Foto: Joyce Fonseca/MST

Desde a inauguração, em novembro de 2016, a loja do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) da capital mineira trabalha o alimento e a arte como expressões da cultura dos trabalhadores brasileiros. O local, na esquina da avenida Augusto de Lima com Contorno, reúne a venda de alimentos saudáveis às noites culturais e à política. Todo mês acontecem mais de dez eventos gratuitos para o público, com a presença de artistas populares dos mais diversos estilos.

Para Guê Oliveira, do setor de cultura do MST, o Armazém tornou-se um espaço de referência para a diversidade de Belo Horizonte, em especial, para grupos afetados pelo discurso de ódio do atual governo. “O Armazém do Campo é a embaixada cultural do MST dentro da grande cidade. Aqui é possível discutir política e ser mulher, negro, LGBT sem se sentir ameaçada. Buscamos criar um ambiente para debate, feito para ser ocupado por quem ainda acredita na transformação dessa sociedade”, convida.

Durante as atividades, entre uma música ou uma poesia, é possível conhecer os frutos da luta pela terra. Alimentos produzidos a partir da agroecologia. Arroz, feijão, café, molho de tomate, conservas, geleias, cachaças, verduras, entre outros, abastecem a loja semanalmente. “Nossa produção se baseia em relações livre de opressões. A agroecologia busca produzir um alimento livre de agrotóxicos, mas livre também da exploração que degrada a natureza e livre da exploração que degrada a vida humana”, explica Paulo Duarte, atual gerente.

Ele conta que é um desafio manter o local abastecido. “Para a produção sair de uma das nossas áreas e chegar aqui são centenas de quilômetros. Tudo começa na ocupação da terra, são áreas de conflito. Por isso é uma logística complicada para manter o preço baixo e uma grande variedade, principalmente porque não há mais política nenhuma que incentive a reforma agrária. Mas o nosso alimento também tem o sabor da luta”, diz.

A loja funciona durante a semana no horário comercial e até mais tarde nos eventos. O endereço é avenida Augusto de Lima, 2136.

Confira a programação:

Projeto Cultura na Sexta – artistas variados da cultura mineira toda sexta-feira, a partir das 19h

Sarau Preto – Toda terceira sexta do mês

Quarta Inviolada – Pereira da Viola e convidados contam as histórias da viola, toda última quarta do mês

Samba da Nossa Terra – grandes bambas mineiros tocam a roda com feijoada, todo sábado às 13h13

Mais detalhes na página do Armazém.

Edição: Joana Tavares

NOVO TRABALHO DA CANTORA RHAISSA BITTAR PROVOCA E ESTIMULA TIRAR AS MÁSCARAS

Julho 30, 2019
UM VELHO CHAMADO JOÃO
Artista acaba de lançar seu terceiro álbum, uma viagem interior para se libertar das múltiplas personas que habitam seu corpo
    
RODOLFO MAGALHÃES/DIVULGAÇÃO

Rhaissa Bittar: “O artista se dá esse tempo de pensar sobre a vida, sobre si, e coloca isso em música, o que faz com que outras pessoas também pensem sobre esses assuntos. No fundo, o João é o velho que existe em mim”

São Paulo — Ela é uma mulher que assume suas “máscaras”, representações diversas para diferentes momentos da vida cotidiana. Pode haver uma para aquele encontro romântico, outra para a reunião em família, outra para um encontro de trabalho, e mais outra para um jantar entre amigos, e outra, e outras. Disposta a se livrar das múltiplas máscaras, Rhaissa Bittar decidiu mergulhar fundo em seu próprio eu. E lá encontrou um homem velho e rabugento. Um homem chamado João.

“Descobri esse cara, o João, um homem velho, com suas rabugices. E um jeito de tirar ele, tirar essa máscara, de me entender melhor, foi fazer esse disco”, explica a cantora, durante participação no programa Hora do Rango. “Só quem tem paciência pra ouvir história de homem velho, vai ouvir esse disco. E cada um tem um velho dentro de si.”

O álbum, batizado justamente de João, é o terceiro na carreira da cantora. Oriunda do teatro, seu lado atriz e a característica de interpretar personagens, outras personas, facilitou a imersão interior. Nascida em Santos e criada em São Paulo, Rhaissa teve estímulos musicais e teatrais desde nova. Uma das lembranças mais fortes é a de cantar com um microfone de brinquedo de cor roja, quando era bem pequena. “Eu viajava com aquele reverbe”, relembra, entre risos. 

Aos 18 anos, foi fazer intercâmbio em Taiwan. Na escola no outro lado do mundo, teve aulas de dança chinesa, de teatro e percussão tradicional. O primeiro álbum, Voilá, tem três músicas cantadas em chinês. No segundo disco, Matéria estelar, cada música é um objeto contando a sua história. “Foi mais um álbum em que fiz essa viagem com o teatro. O show virou um espetáculo, me transformei numa boneca que contava a história dos outros objetos. E no fundo era tudo pra falar do ser humano”, afirma Rhaissa.

Lançado em junho, o novo álbum tem 10 faixas, compostas por diferentes autores. Estão nele Jorge da Capadócia, clássico de Jorge Ben Jor, agora numa versão com leveza quase oriental, Pra acordar, de Suely Mesquita e Paulo Monarco, e músicas de Mauricio Pereira (Um dia útil), Vitor Ramil (Livro aberto), Isabela Moraes (Made in produto), Paulo César Pinheiro (Alento), Arthur de Faria e Daniel Galera (Você tá bem?), além de A maior ambição (Zé Manoel/Juliano Holanda), Velhas sílabas (Filipe Trielli) e Toda vez que eu dou um passo o mundo sai do lugar (Siba).

Rhaissa explica que o repertório do álbum foi escolhido por meio da pesquisa com o personagem João. “Era um jeito de falar de um ser humano que passava por questões humanas, de se questionar, fazer um balanço da vida, as frustrações, os amores, a fé.” A canção Jorge da Capadócia, por exemplo, foi a maneira encontrada pela artista para abordar a temática da fé. “Fui escolhendo músicas que mexiam comigo e com o João que existe dentro de mim.”

No clipe de Toda vez que eu dou um passo o mundo sai do lugar, ela canta com uma “cabeça” de nuvem, mais um elemento trazido do teatro e usado para construir a narrativa da história. “É uma dessas máscaras com que brinquei para falar sobre introspecção, sobre se olhar, se enxergar, e essa é a mais louca do álbum, dá vontade de dar passos e fazer o mundo mudar de lugar”, explica. E logo acrescenta: “O artista se dá esse tempo de pensar sobre a vida, sobre si, sobre relacionamentos, e coloca isso em música, o que faz com que outras pessoas também pensem sobre esses assuntos. No fundo, o João é o velho que existe em mim, são as minhas frustrações, as minhas rabugices, tudo eu mesmo. Olha que louca sou!”.

Quando foi que o nosso amor
Se transformou num par
Das velhas sílabas?
Quando que o sentido
Se desgovernou
Deixou a nossa vida assim
Sem mais?
Mas como vou falar da vida
Se os poetas, os floristas
Astronautas, beletristas
Oucos, sadomasoquistas
Tanta gente mais inteligente do que eu
Não conseguiu falar

Trecho da música Velhas Sílabas, do álbum João

Cultura como alvo

As transformações políticas pelas quais passa o Brasil não deixam incólume o setor artístico. Pelo contrário. A música, o cinema, o teatro e as artes em geral têm sido atacadas sistematicamente pelo discurso crescente da extrema-direita no país, impulsionado pelas falas do próprio presidente Jair Bolsonaro (PSL). 

Rhaissa disse que sente os colegas artistas desanimados com o atual cenário político e o rumo que o país tem tomado. “De alguma forma a gente se fortalece e se inspira uns com os outros, com o que a gente faz e segue fazendo”, explica. E até brinca ao dizer que o jargão do momento é falar: “Ainda mais nos tempos atuais…”; “Ainda mais agora…”; “Ainda mais com o que a gente está passando.”

Ela lembra que na época da divulgação do segundo álbum, fez muitos shows gratuitos num roteiro cultural da prefeitura de São Paulo, e agora não sabe mais como está esse circuito. Ainda com o segundo disco, fez turnê na China, em 2015, graças ao apoio de um programa do governo federal que levava artistas para o exterior. Também diz não ter mais informação se tal programa ainda existe.

A opinião é compartilhada pelo violonista Thiago Roover, que acompanha Rhaissa na turnê do álbum João.“Não tem mais a facilidade de vender o show pra prefeitura, então onde é o nosso palco? É a rua? Então vamos fazer show na rua”, afirma, e cita o festival Rock in Rua, organizado por ele e outras bandas em Campinas, em 2018.

Ele é da opinião de que o artista deve se posicionar. Em seu primeiro álbum solo, Aurora Boreal, lançado recentemente, compôs uma música sobre a situação do país, “Xau querida (democracia)”. “Nesses tempos de crise, a gente começa a refletir sobre tudo e tomar posse do que seria a nossa palavra em relação a isso”, explica Thiago Roover. “Foi a nossa forma de colocar o nosso ponto de vista em relação a isso. Quem saiu perdendo foi a democracia, fomos nós, foi tudo aquilo que a gente construiu de 64 pra cá. Precisamos ser mais unidos para que isso tenha um final feliz. A gente está vendo que a casa está caindo e, se a gente não fizer nada, vai cair junto com ela.”

Rhaissa avalia que a polarização do país faz com que as pessoas fechem os ouvidos na hora de dialogar. Entre as famílias, ela acredita que as desavenças políticas estão sendo o estopim até mesmo para trazer à tona problemas pessoais. “Nas famílias, acaba até fugindo da política mesmo, de quais rumos vamos tomar, o que vamos fazer, e acaba se tornando um motivo para descarregar frustrações pessoais, ou questões pessoais entre as pessoas.” 

Entre uma máscara e outra que era despida, a dupla apresentou no programa três canções ao vivo do novo álbum: Velhas sílabasPra acordar e Um dia útil. A última, Rhaissa Bittar define como um mantra da profissão. O estímulo para seguir em frente, custe o que custar. “Toda vez em que desanimo ou me sinto perdida, como às vezes a gente se sente na vida, ouço essa música e ela me dá um norte, é um dia útil.”

O RETORNO DO PUNK-ROCK DA BANDA AS MERCENÁRIAS PROMETE SACUDIR O PROGRAMA ‘HORA DO RANGO’

Julho 30, 2019
NA VEIA
Formada nos anos 1980, banda ícone do underground paulistano está novamente na ativa, liderada pela baixista Sandra Coutinho
  
DIVULGAÇÃO

Agora no formato “power trio”, Mercenárias volta à ativa com a baixista Sandra Coutinho, a baterista Michelle Abu e a guitarrista Marianne Crestani

 

São Paulo — O punk vai invadir o estúdio da Rádio Brasil Atual no programa Hora do Rango desta terça-feira (30). É a vez da lendária banda As Mercenárias, formada em São Paulo pela baixista Sandra Coutinho no começo dos anos 1980, em companhia da vocalista Rosália Munhoz, a guitarrista Ana Maria Machado e Edgard Scandurra (grupo Ira!), que na época tocava bateria (1982-1986 ), depois substituído por Lou.

Com um som pesado, letras politizadas e influências de Sex Pistols e Joy Division, a banda lançou seu primeiro álbum, Cadê As Armas, em 1986. O sucesso levou ao segundo disco, Trashland, em 1988, porém, pouco depois o grupo teve seu contrato rescindido com a gravadora e acabou se desfazendo. Ana Maria Machado, Rosália Munhoz e Lou acabaram desistindo da carreira musical, enquanto Sandra foi morar na Alemanha.

Décadas depois, As Mercenárias volta à ativa, novamente liderada pela baixista Sandra Coutinho, agora tendo ao lado Michelle Abu (bateria e backing-vocals) e Marianne Crestani (guitarrista). O power trio quer voltar a mostrar a força do seu punk-rock, e novamente agitar o público com músicas como Me Perco Nesse TempoSanta Igreja e Polícia.

No programa, as integrantes da banda contam um pouco dessa longa caminhada, com suas idas e vindas, relembram histórias e músicas, e falam do que esperam nesse retorno aos palcos.

O programa

Hora do Rango, apresentado por Colibri Vitta e premiado pela Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA), recebe ao vivo, de segunda a sexta-feira, ao meio-dia, sempre um convidado diferente com algo de novo, inusitado ou histórico para dizer e cantar. Os melhores momentos da semana são compilados e reapresentados aos sábados e domingos, no mesmo horário.

VÍDEO DE RESISTÊNCIA IVAN LINS: DAQUILO QUE EU SEI

Julho 29, 2019

ARTISTA JUAZEIRENSE É UM DOS TRÊS PREMIADOS NO 70° SALÃO DE ABRIL

Julho 29, 2019

ARTE

Em 2019, foram inscritas 605 obras de 383 artistas de todo o estado

Lívio do Sertão

Brasil de Fato | Fortaleza (CE)

29 de Julho de 2019.

Esses são os desenho que fazem parte do Caderno de Artista que foi exposto junto alguns desenhos emoldurados e algumas esculturas. - Créditos: Acervo do artista
Esses são os desenho que fazem parte do Caderno de Artista que foi exposto junto alguns desenhos emoldurados e algumas esculturas. / Acervo do artista

O Salão de Abril, importante evento das Artes Visuais no calendário cearense, iniciou suas atividades em 1943, como uma proposta da Secretaria de Cultura da União Estadual de Estudantes, em sua 70º edição – À sombra do Baobá – homenageou as artistas Nice e Estrigas, se inspirando na vida e produção da família Firmeza. Neste Salão foram inscritas 605 obras de 383 artistas de todo o estado, sendo selecionadas 30 para exporem seus trabalhos em vários espaços da cidade, como o Minimuseu Firmeza, o Centro Cultural Casa do Barão de Camocim e o Centro Cultural Banco do Nordeste-CCBNB, que depois foi substituído pelo Centro Cultural Belchior, após censura de um dos trabalhos.

Um dos três premiados, Leo Ferreira, 23, é Designer de Produto com habilitação em joalheria pela Universidade Federal do Cariri (UFCA), empreendedor criativo com sua marca A Joia do Leo, artista visual e está de mudança para Recife-PE para dar início ao seu mestrado em Design na UFPE.

Em seu currículo já acumula a exposição individual Atrás da Porta e várias exposições coletivas, passando por Crato, Fortaleza e Juazeiro do Norte, sendo as mais recentes Serilusora na Galeria Célia Bacurau da URCA e Rastros Corporais da Galeria “sem título”. Seu trabalho pode ser conhecido através do site oleoferreira.wixsite.com/arte

No Salão de Abril participou com seu trabalho Cacimbas sem fundo, 2019, entrado para a Coleção da Prefeitura Municipal de Fortaleza, que é a organizadora do evento. “Foi pra mim um reconhecimento importante, como sendo Juazeirense e estar levando um trabalho que tem relação com minha vivência na cidade, de ver que há muito mais a ser aproveitado e descoberto do nosso Cariri”, afirma Leo sobre o prêmio.

Além de Leo, também participaram as artistas Andreia Sobreira e Cléo do Vale(Wà Coletivo) do Cariri, apresentando um pouco da produção visual da região para todo o estado. Sobre as dificuldades que artistas do interior enfrentam Leo avalia a participação do trio como “muito importante e carrega uma responsabilidade grande também, não só por “representar” o Cariri, pois acho que esse é grande demais para estar resumido no trabalho de poucas pessoas, mas por estarmos ocupando um local de interação e de troca que muitos do interior não puderam” defende ainda que “esse local serve para chamar mais atenção para o que se é produzido no Cariri, para as diversas pessoas que também trabalham duro para manter sua rotina criativa, seus estudos”.

O artista ainda compartilha um pouco de sua preocupação com os desmontes da cultura, “vejo como um sintoma do cenário de truculência e intolerância que vivemos ardentemente no Brasil, diante de um (des)governo autoritário, corrupto e retrógrado que alimenta práticas de violência, burrice e censura”, fala também da censura do CCBNB com o trabalho dos artistas Eduardo Bruno e Waldírio Castro pelo fato de da temática LGBT. Leo nos chama atenção para a situação que os três Centros Culturais do Banco do Nordeste – Juazeiro do Norte (CE), Fortaleza (CE) e Sousa (PB) – enfrentam com demissão de servidoras terceirizadas, cortes de verbas e ameaça de encerramento de atividades.

“O pior de tudo é que o sucateamento dessas instituições prejudicam o povo do país inteiro, não só as artistas, músicos, atrizes e dançarinos que ocupavam esse espaço, mas principalmente as mães (como a minha) que levam as crianças ao teatro nos fins de semana, os jovens que veem exibição de filmes nacionais gratuitamente, as pessoas que vão a um show, apresentação de orquestra, clubes de leitura, tudo isso é precarizado e junto disso também o pensamento do povo, o exercício do olhar” completa o artista sobre a crise cultural e educacional que o país enfrenta.

Mas Leo não desamina: “É uma luta diária e o discurso de intolerância se gruda na nossa mente gerando as piores crises. Eu resisto desenhando, todos os dias, ainda que o mundo não dê chance pra isso, buscando apoiar e também tendo apoio de quem está no mesmo barco. Apesar do cenário eu tenho esperança de melhoria, com muita luta é claro.”

Edição: Monyse Ravena

FESTIVAL DE DANÇA DO LITORAL OESTE CEARÁ GANHA AS RUAS DE ITAPIPOCA

Julho 29, 2019

DANÇA

A programação é gratuita e conta com formações, exposições, rodas de diálogo, circulações itinerantes e muito mais

Da Redação

Brasil de Fato | Fortaleza (CE)

29 de Julho de 2019.

O Festival acontece de 29 de julho a 03 de agosto como uma forma de integrar, mobilizar e difundir a dança cênica no interior cearense. - Créditos: Divulgação
O Festival acontece de 29 de julho a 03 de agosto como uma forma de integrar, mobilizar e difundir a dança cênica no interior cearense. / Divulgação

O município de Itapipoca (CE) recebe o Festival de Dança do Litoral Oeste Ceará, que chega à sua 11ª edição. O Festival acontece de 29 de julho a 03 de agosto como uma forma de integrar, mobilizar e difundir a dança cênica no interior cearense. A programação é gratuita e conta com formações, exposições, rodas de diálogo, circulações itinerantes e muito mais. Mais informações pelo Facebook do evento: dancalitoraloeste

Programação

Dia 29 de Julho

Local: Assentamento Maceió – Comunidade Sitio Coqueiro/Igreja Santa Luzia Horário: 19h

● Instalação pedagógica “Agrobiodiversidade”;

● “Iracema” – Rosa Primo (Fortaleza);

● “Negro preto luminoso”- Grupo N ∞ (Fortaleza);

● “Balaias” – Nivea Jorge e Nazaré Rocha (Itapipoca/Itapajé);

● “O meu coco é a cor da minha gente” – Grupo Balanço do coqueiro (Itapipoca);

Dia 30 de Julho

Local: Terra indígena Tremembé da Barra do Mundaú/Aldeia Sitio São José

Horário: 19h

● “Terreiros virtuais” – Cia Flex de Dança Contemporânea (Trairi);

● “Tempestade” – Silvia Moura (Fortaleza);

● “Revelação dos encantados” – Grupo Parente Torém (Itapipoca CE);

Dia 31 de Julho

Interferências de rua 

● Praça da Matriz, integrando a feira agroecológica e solidária de Itapipoca – 9hs: “Ação performática I: aspectos da presença” – Coletivo Bailarinas: Todo projeto começa do meio (Fortaleza);

● Rodoviária (Terminal Rodoviário Deputado Danúsio Barroso, R. Caio Prado, s/n), às 14hs: “Caecus” – Cia de Dança Ciclos (Tabuleiro do Norte);

Mostra aberta

Local: Centro Integração Esporte e Cultura – CIEC (Ginásio Danuzão): Rua Oswaldo Primo Caxilé, Bairro Cruzeiro)

Horário: 19h;

● “Todas as mulheres” – alunas de ritmos do programa arte no Ciec (Itapipoca);

● “Descaso” – Cia de Dança de Itapajé (Itapajé);

● “Entrelaços”- Cia Ikannús (Itapipoca);

● “Milagreiro” – Cia Rastro (Quixadá);

● “Revelação dos encantados” – Grupo Parente Torém (Itapipoca);

Dia 01 de Agosto 

Local: Círculo Operário (Av. Duque de Caxias, 329 – Centro – Itapipoca CE)

Horário: 09h

Roda de diálogo com Isabel Marques (SP)

Tema: “Dança e narrativas de engajamento – Paulo Freire e o corpo consciente”;

19hs: Programação restrita exclusivamente para convidados/as do festival

Celebração dos 25 anos da Cia Balé Baião

● Exposição fotográfica/instalação Balé Baião;

● Lançamento do livro: “Dançar territórios de reinvenção”, produção coletiva da Escola Livre Balé Baião com o apoio da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará (SECULT);

● Espetáculo “Pátria sertaneja, a dança do corpo rebelde”, remontagem de 1997; 

● Show “Andarilhos da utopia” – Tambores Afro Baião (Itapipoca);

Dia 02 de Agosto

Local: Ponto de Cultura Galpão da Cena (Rua Raimundo Lopes de Sousa N° 331, Bairro Coqueiro, Itapipoca CE)

Horário: 09h

Fórum de profissionais e mobilizadores da dança do interior – Tema: “A cultura vive”;

Mostra aberta – 19h

● “Yugo” – Nodo Yara (Colombia/Fortaleza);

● “Implosão sob peles”- Grupo BitZero (Fortaleza);

● “Graça” – Cia da arte andanças (Fortaleza);

(Homenagem a Andrea Bardawil e os 30 anos da Cia Andanças);

• “O meu coco é a cor da minha gente” – Grupo Balanço do Coqueiro (Itapipoca);

Dia 03 de Agosto

Local: Praça da matriz (Av. Anastácio Braga, centro de Itapipoca)

Horário: 20h

● “Revelações” – Escola de dança de Paracuru (Paracuru);

● “Caiçaras” – Arreios Cia de dança (Trairi);

● “Estado de luta” – Cia Balé Baião (Itapipoca);

(Homenagem a Claudia Pires – 25 anos de dança)

● “Vetin” – Grupo de Dança Rede Cuca (Fortaleza);

● Show Musical – Bruna Ene (Fortaleza);

● Show Musical: “Da Silva el hijo de las américas” – Banda Dona Zefinha  e Pato Mojado (Itapipoca/Argentina)

Edição: Monyse Ravena

BENEGÃO COMPARTILHA RELATOS DE CENSURA EM SEU SHOW APÓS CRITICAR BOLSONARO EM FESTIVAL

Julho 28, 2019
28 DE JULHO DE 2019.

A apresentação no Festival de Inverno de Bonito foi interrompida pela Polícia Militar após o cantor criticar o presidente

O músico BNegão compartilhou relatos que denunciam censura em seu show com a banda Seletores da Frequência no Festival de Inverno de Bonito, no Mato Grosso do Sul, que aconteceu na noite de sábado (27).

O grupo se apresentou após o show da cantora Gal Costa, que dançou ao som do coro de “ei, Bolsonaro, vai tomar no c*”. Assim como na performance de Gal, o show de BNegão também foi marcado por críticas ao presidente Jair Bolsonaro.

Durante o show, segundo relatos compartilhados no Instagram do próprio BNegão, o cantor criticou o presidente, falando contra a violência policial e contra os ataques nas aldeias Wajãpis, no Amapá. O show então foi interrompido pela Polícia Militar, segundo alguns presentes que divulgaram o episódio nas redes sociais.

“A polícia chegou truculenta expulsando todo mundo”, disse uma das pessoas que assistiu ao show e que teve o relato divulgado nos stories do BNegão.

Em resposta a uma conta que disse que o festival devia explicações, BNegão disse que o festival “não tem culpa no cartório”.

Confira alguns dos relatos que foram divulgados no perfil do cantor:

MORRE AOS 98 ANOS RUTH DE SOUZA, A PRIMEIRA ATRIZ A SE APRESENTAR NO MUNICIPAL DO RIO

Julho 28, 2019
28 DE JULHO DE 2019.

Artista tinha mais de sete décadas dedicadas à dramaturgia

Faleceu na manhã deste domingo (28) a atriz Ruth de Souza. Ela estava internada em um hospital particular na zona sul do Rio de Janeiro por conta de uma pneumonia. As causas da morte não foram divulgadas. A família tenta que o corpo da artista seja velado no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, local onde Ruth fez história na dramaturgia brasileira.

Ela foi a primeira atriz negra a encenar uma peça no tradicional palco carioca. Com uma obra vasta na TV, no teatro e no cinema, Souza tem como um dos fatos mais marcantes da carreira ter sido indicada ao prêmio de melhor atriz no Festival de Cinema de Veneza, em 1954, na adaptação de Sinhá Moça, onde fez par com Grande Otelo.

Presente desde a fundação da TV no Brasil, Ruth fez mais de 20 novelas nas emissoras Tupi, Excelsior, Record e Globo. No cinema ela aparece em mais de 30 filmes. O último trabalho de Ruth de Souza foi a minissérie Se Eu Fechar os Olhos Agora.