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Arles, 09 de agosto de 1888
As Fiandeiras (1657), VELÁZQUEZ
Las Hilanderas ou La Fábula de Aracne, Madrid, Museu Nacional del Prado
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Van Gogh compara uma de suas obras com um outro quadro que muito admira e que Theo possui:
” Este restaurante em que estou é bem curioso, é inteiramente cinza, o assoalho é de betume cinza com uma calçada, papel cinza nas paredes. Persianas verdes sempre fechadas, uma grande cortina verde frente à porta sempre aberta, impedindo a poeira de entrar.
Isso já e de um cinza Velázquez – como nas Fiandeiras -, não falta nem mesmo o raio de sol muito fino e muito violento através de uma persiana, como aquele que atravessa o quadro de V. Mesinhas com toalhas brancas naturalmente. E, depois, atrás deste aposento cinza-velázquez, percebe-se a antiga cozinha, limpa como uma cozinha holandesa, assoalho de lajotas muito vermelhas, legumes verdes armários de carvalho, fogão de cozinha com os cobres luzentes, de ladrinhos azuis e brancos, e o grande fogo laranja-claro .”
Diego Rodríguez da Silva y Velázquez foi um dos maiores coloristas do século XVII. Os retratos representam a grande maioria de seu trabalho atestando neles toda sua genialidade no que tange as possibilidades de exploração dos efeitos das cores. É ainda sobre esta questão que Van Gogh se utiliza para ilustrar o ambiente na qual se encontra, um restaurante parisiense que cheira à la Velázquez. Este pintor retratista emerge na corte espanhola de Filipe IV que, por sua vez, andava mal das pernas, envolvida em escândalos e economicamente abalada. A decadência da corte espanhola é transformada por Velázquez numa explosão de simplicidade e realismo.
Velázquez, espanhol nascido em Sevilha em 6 de junho de 1599, filho de uma família da baixa nobreza. No inicio de sua juventude se tornou aprendiz de Francisco Pacheco, um famoso pintor, teorista e conhecedor de arte daquela cidade. Com esta convivência de aprendizagem foram ensinadas as técnicas do desenho e da pintura, o estilo dos retratos, naturezas mortas e ainda as técnicas inovadoras de seu tempo, representadas pelos trabalhos de Caravaggio, como o jogo luz-sombreado. Quando finaliza seus estudos com Pacheco em 1617, Velázquez abre seu próprio atelier e, no ano seguinte, casa-se com Juana, filha de seu mestre. A vida, no entanto, é ganha com trabalhos religiosos. Por meio de alguns contatos, o sogro de Velásquez consegue que ele pinte o retrato do jovem rei da Espanha, Filipe IV. O retrato, portanto, se tornou admirável aos olhos do rei que o convidou imediatamente a adentrar o círculo dos funcionários reais no ano de 1623 como um pintor da corte, e o único autorizado a lhe pintar.
O trabalho na corte espanhola proporcionou a Velázquez conhecer a magnífica coleção das obras de arte da realeza. O jovem pintor mergulha no estudo detalhado de cada obra da coleção (principalmente os artista Venezianos como Ticiano) tornando seu trabalho cada vez mais refinado. Ao observar cuidadosamente as obras do início de sua carreira com aquelas que realizadas a partir de 1630 notamos a intensidade harmônica de sua paleta de cores. Ocorre que o famoso pintor flamengo Peter Paul Rubens, em visita a corte madrilena em 1628 conhece Velázquez e se impressiona com a atmosfera de sua pintura. Rubens orienta ao pintor que busque empreender uma viagem à Itália, aonde possa ver de perto, conhecer e estudar os grandes pintores. Assim, Velázquez obtém a licença para uma primeira e breve viagem em 1630. Esta viagem foi essencial para que ele criasse seu estilo original de pintura, baseado na notável aplicação de pigmento para criar efeitos de luz e cor que aproximam este fenômeno natural a um grau extraordiário.
De volta a Espanha, Velázquez é promovido para Assistente de Guarda-roupa, um cargo de alta confiança e responsabilidade com a imagem da realeza. Mas obviamente o pintor continua a ser o pintor da corte e pinta cada vez mais retratos do rei, rainha, seus filhos, súditos além das construções reais como o Palacio del Buen Retiro e a Torre de la Parada por exemplo.
Em 1643 ele é promovido novamente como Superintendente dos trabalhos no palácio e Cavalheiro dos quartos. Em 1647 ele é o escolhido para modernizar o velho Palácio de Alcázar. Com o rei tendo sua confiança cada vez maior no pintor, houveram várias promoções para cargos da alta administração real, sobrando assim pouco tempo para pintar. Por isso seu genro Juan Bautista Martinez de Mazo o auxiliou a fazer várias cópias oficiais de suas pinturas.
Em uma segunda viagem, o pintor tem mais tempo para a apreciação dos grandes mestres e é também quando realiza o retrato do Papa Inocêncio X além do famoso Rokeby Venus.
Em 1658, o pintor foi nomeado Cavaleiro de Santiago, uma grande honraria que mereceu pelo seu apoio e devoção ao rei. Dois anos depois, após o retorno de uma longa viagem para a fronteira com a França a pedido do rei e da corte, Velázquez adoeceu e morreu em 6 de agosto 1660 na cidade de Madrid, seguido de sua esposa que se foi apenas uma semana depois.
Velázquez trabalhou em uma época conhecida como “Século de Ouro” da cultura espanhola, onde grandes obras como Don Quijote e as peças de Lope de Vega foram escritas. A obra de Velázquez é repleta de cinzas, tons castanhos e esverdeados. O interessante de suas pinturas são o realismo sem o exagero do detalhismo. É aí que mora a grande sacada das cores, as finas e as espessas camadas de tinta são usadas de forma a sobressair o que há de mais profundo no tema-assunto.
Sobre a Obra
Representação complexa e altamente intelectual do mito clásico de Aracne. Segundo a fábula narrada pelo autor romano Ovidio (Metamorfosis, Livro VI, I), Aracne era uma joven lidia (região da Ásia Menor) mestra na arte de tecer, que desafiou Atena, deusa da Sabedoria, a supera-la em habilidade. Esta, consciente durante l competição da supremacia da mortal e vendo sua chacota ao representar em seu tapete a infidelidade de seu pai Zeus, convertendo-se em touro e raptando a ninfa Europa, converteu a Aracne em aranha.
O mito aparece representado em dois planos: em baixo a aparênciai de um dia cotidiano na Fábrica de tapetes de Santa Isabel. Ao fundo da cena o rapto de Europa aparece fiado no tapete pendurado na parede e, ante Atena, vestida com armadura, castiga a Aracne. As mulheres que observam o sucesso, e que poderiamos confundir com as clientes da fábrica, seriam na realidade as jovens lidias testemunhas no momento. No primeiro término as fiaderas representariam o desenvolvimento do concurso. Atena fiando a roda e Aracne desfiando uma meada.
Esta obra tem sido interpretada pelos estudiosos como uma alegoria a nobreza da arte da pintura e uma afirmação da supremacia do própio Velázquez. A complexidade iconográfica elevaria la criação pictórica a altura de oturas artes melhor consideradas no século XVII, como a poesia ou a música, e as referências aos grandes pintores, como Tiziano e Rubens elevariam Velázquez à altura dos grandes gênios da Historia da Arte.
Este quadro foi pintado para don Pedro de Arce, montero Real. Suas dimensiones foram ampliadas no alto e na largura depois do dano sofrido na obra no incêndio de Alcázar de Madrid em 1734.
Esteve no Palácio del Buen Retiro entre 1734 e 1772, entre 1772 e 1794 no Palácio Real de Madrid. Ingressou nas coleções do Museo del Prado em 1819.
Auto Retrato retirado da obra As Meninas (Las Meninas de 1656) que pode ser vista abaixo.
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Às sextas e terças, esta coluna traz obras digitalizadas de outros pintores que influenciaram o pintor monoauricular Van Gogh e obras suas, mas tão somente as que forem citadas nas Cartas a Théo, acompanhadas da data da carta que cita a obra, bem como as citações sobre ela e uma pequena biografia de seu autor. Para outros olhares neste curso, clique aqui.