Archive for Janeiro, 2023

NOVO CLIPE DE ANITTA: CRÍTICAS A CENAS “VAZADAS” REPRODUZEM PRECONCEITOS AO TENTAR COMBATÊ-LO

Janeiro 31, 2023

FUNK

Anitta é uma artista tão idolatrada quanto “cancelada” pois trabalha com as contradições do sistema

Thiagson*

 31 de Janeiro de 2023 –

Anitta apenas joga muito bem um jogo cujas regras não são dela, são do capitalismo – VALERIE MACON / AFP

“Várias mamada no beco, eu vou levar essa pra viela”, cantou MC Levin no funk “Vai Pereca”.

A imagem de uma mulher fazendo sexo oral em um homem durante ou depois de um baile de favela é tão frequente em letras de funk quanto o adultério na literatura europeia. 

Se falar de uma “mamada no beco” não surpreende ouvintes de funk, ver Anitta encenando sexo oral em uma favela causou surpresa, mas revolta também.

Falo aqui das imagens “vazadas”, na última sexta-feira (27), da gravação de seu último clipe que ainda não foi lançado.

Depois das imagens, Anitta virou, mais uma vez, assunto nas redes sociais. Vi muitas críticas à cantora ganhando likes e compartilhamentos, vi o aumento de seguidores de perfis no Instagram que condenavam a encenação de Anitta.

Só de notar esse crescimento “às custas dela”, já desconfiei…

As críticas me lembraram das tragédias gregas. Aquelas tragédias que falam de alguém que tenta escapar de um destino, mas, na tentativa de fuga, a ele retorna.

Édipo foi avisado que seu destino era matar o próprio pai e se casar com a própria mãe. Foi tentando fugir desse futuro predestinado que ele fez exatamente o esperado. Matou o pai e casou com a mãe.

As críticas trágicas à Anitta tentavam combater preconceitos, mas acabaram reproduzindo racismo, machismo e também moralismo.

:: “Anitta mostra que funkeiro pode criar o que quiser, inclusive reggaeton”, diz pesquisadora ::

Vamos analisar algumas dessas críticas e entender por que Anitta é uma artista tão idolatrada quanto “cancelada”. Anitta trabalha com as contradições do sistema!

Crítica 1: “Anitta reforça a imagem de uma favela hipersexualizada, o que contribui para o turismo sexual.”

Combater o turismo sexual é uma causa legítima e necessária. Combater o estereótipo (racista) de uma favela hipersexualizada é completamente legítimo e necessário! Mas, atribuir problemas estruturais a uma pessoa (por mais influente que seja) para atacar seu trabalho que sequer foi lançado parece a velha estratégia de usar consensos éticos para calar ainda mais as produções de funk. Algo do tipo: “chega de funk porque as pessoas desse movimento são machistas, homofóbicas, objetificam a mulher, romantizam o crime e sexualizam as crianças”.

Historicamente, essas críticas não procuram de-bater, mas com-bater os artistas de funk. Críticas assim também costumam vir de pessoas brancas do mundo acadêmico.

“Funkeiro não é trouxa, eu sei que você não quer melhorar o mundo. Você só quer me calar”, penso isso toda vez que lido com brancos acadêmicos “críticos” do funk.

Crítica 2: “Tá, mas e essa cultura pornô machista na essência e que objetifica a mulher usada por Anitta para difundir seus clipes?”

Muito antes da objetificação dos corpos ser problematizada na pornografia, ela deveria ser problematizada no próprio capitalismo. O corpo, principalmente da mulher preta periférica, é visto apenas como força de trabalho. Ignorar que é o capitalismo quem nos objetifica é uma estratégia neoliberal/moral que problematiza a objetificação no sexo, mas não problematiza a objetificação no trabalho.

Crítica 3: “Ah, mas o sexo oral indica a submissão da mulher ao homem! Tudo que macho adora!”

Encarar a cena do sexo oral como submissão ao homem é colocar o homem no centro do ato! Nem tudo é sobre eles. Isso impede que enxerguemos o sexo oral como uma forma mútua de prazer.

Mas, concordo que a cena ficaria ainda mais questionadora se o homem estivesse “mamando” a Anitta.

Crítica 4: “É apenas pornografia para chamar a atenção”

Um homem branco de esquerda postou a seguinte frase em seu instagram: “feminismo sem luta de classe é um boquetão do beco”. Esse comentário mostra como a cena sexual de Anitta está sendo reduzida a um “produto comercial pornô desprovido de reflexão”, isso é uma outra forma de dizer que pessoas como Anitta não pensam…

Reduzir a pornô é não enxergar o trabalha com a estética do corpo e da sexualidade periférica; é não enxergar que há ali questionamento moral e político. Reduzir a pornô ignora  o fato de que o uso dos becos reflete a falta de dinheiro para um motel ou outro lugar apropriado para se fazer sexo. Reduzir a pornografia é não encarar o trabalho de encenação como arte. E sabemos que a arte retrata o sexo, a nude e a “mamada”.

Vejam uma famosa cena de sexo oral na Vila dos Mistérios, cerca de 79 a.C.

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Crítica 5: “Ah, mas a Anitta incentiva muitas meninas jovens a fazerem o mesmo.”

Esta visão parte da premissa de que jovens de favela recebem e aceitam passivamente o que há nos clipes. Novamente é achar que a favela não pensa! Evidente que há o impacto social da arte e a responsabilidade dos artistas, mas o mito da recepção passiva dos clipes é uma forma de tentar censurar muitos funks.

E sobre censura, vale dizer que segundo o relatório The state of artistic freedom 2018 da organização Free Muse, o Brasil é o quarto país que mais processa artistas no mundo e 54% destes processos são contra musicistas.

Além disso, o que incentiva muitas condutas socialmente reprováveis é a vulnerabilidade socioeconômica… não o funk ou a Anitta.

Crítica 6: “Ah, mas ela não precisa disso, já tem milhões de seguidores”

Toda vez que falamos de Anitta, estamos dando exatamente o que ela quer: atenção e engajamento ao seu trabalho. O mundo da arte pop é extremamente descartador de pessoas. Há muitos casos de artistas com milhares e até milhões de seguidores que têm pouquíssimo engajamento. Fizeram sucesso e foram esquecidos. Algo muito comum no funk. Muitos fazem sucesso, poucos fazem carreira. Anitta apenas joga muito bem um jogo cujas regras não são dela, são do capitalismo.

E inclusive quem critica Anitta em momento oportuno também está jogando o jogo do mercado.

Crítica 7: “Isso é péssimo”

Muitas críticas traziam ainda os adjetivos “péssimo”, “ruim” e “mau”. Mas, uma análise mais científica não se faz com esses adjetivos que não se explicam e escondem a dificuldade branca em lidar com o Funk.

O trabalho de Anitta exige de nós menos julgamento e mais trabalho de análise.

Trazer esta perspectiva não significa passar pano para a Anitta. A crítica que podemos fazer a ela está no individualismo. O que a favela ganha com tudo isso?

Uma condenação caça-likes esconde uma postura mesquinha de quem cospe no prato que come… Afinal, quem gerou toda a discussão foi o próprio trabalho de Anitta. Quem produz conteúdo deve engajamento a ela.

“Cuspir no prato” não! Para fazer jus a cena de Anitta, a melhor metáfora seria “cuspindo o leite mamado”.

*Thiagson é musicólogo, professor de música, doutorando em Música pela USP, youtuber, defensor das músicas periféricas e escritor de livros sobre música.

ARTISTAS DENUNCIAM POLÍTICA DE GENOCÍDIO CONTRA POVO YANOMAMI EM CAMPANHA DE AJUDA HUMANITÁRIA

Janeiro 30, 2023

MOBILIZAÇÃO

“Para um povo ser dizimado, primeiro começam pelas crianças”, alertam os artistas em campanha organizada por ONG

Redação Rede Brasil Atual

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 30 de Janeiro de 2023 –

Terra Indígena Yanomami passa por uma crise humanitária, com casos de desnutrição, malária, pneumonia e contaminação por mercúrio, agravada pela invasão de mais de 20 mil garimpeiros – Reprodução/ONG Ação Cidadania

Artista de projeção nacional como Wagner Moura, Marieta Severo, Leticia Colin, Fernanda Abreu e Bruno Gagliasso, entre outros, participam de campanha de ajuda humanitária SOS Yanomami, divulgada ontem (29) pela ONG Ação Cidadania. Ao tempo em que denunciam a política de genocídio contra o povo Yanomami em Roraima, eles também solicitam cestas básicas, produtos de higiene, doações e outros recursos aos povos indígenas da maior reserva do Brasil, acometidos pela que já é considerada a maior crise humanitária deste século no país. 

O vídeo da campanha, que conta também com Carlinhos de Jesus, Mart’nália e Antonio Calloni, chama atenção, em especial, para a mortalidade das crianças. Nos últimos quatro anos, ao menos 570 delas morreram de fome, de acordo com dados do Ministério da Saúde compilados pela agência Sumaúma. Somente entre as crianças de até 5 anos, 152 vieram óbito por desnutrição durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). 

Houve aumento de 360% em comparação ao período anterior, quando 33 foram mortos. Abandonados pelo governo, os Yanomami ainda passaram a conviver com o avanço da malária, de casos de pneumonia e contaminação por mercúrio, agravados pela invasão de mais de 20 mil garimpeiros na área demarcada, onde vivem 30 mil indígenas. No período, 21 ofícios com pedidos de socorros foram enviados ao governo Bolsonaro. Mas entre 2019 e 2022 nenhum deles foi respondido. 

É genocídio

“Para um povo ser dizimado, primeiro começam pelas crianças. E é isso que está acontecendo com os indígenas Yanomami em Roraima e no Amazonas”, denunciam os artistas. 

“E a causa dessas mortes está ligada ao garimpo ilegal no território que é sagrado para os indígenas. Esses garimpeiros poluem a água potável dos rios e desmatam o solo, prejudicam a alimentação e também traz doenças como malária e sarampo. Precisamos ajudar agora os nossos povos originários. Convidamos você a se juntar a gente e à Ação da Cidadania, que combate a fome há quase 30 anos. Vamos nos unir pelo futuro das crianças Yanomami, pelo futuro de uma povo que carrega a história do nosso país”, acrescentam no vídeo. 

De acordo com a organização, a ONG já está nos territórios Yanomami para distribuir os insumos arrecadados. As doações para a campanha Ação da Cidadania – SOS Yanomami podem ser feitas pelo PIX sos@acaodacidadania.org.br ou pelo site da organização que você acessar, clicando aqui. A iniciativa foi compartilhada também por parlamentares, como o deputado federal e ambientalista Nilto Tatto (PT-SP). “Os povos indígenas gritam por socorro, precisamos ajudá-los”, destacou em suas redes. 

Operação de combate ao garimpo

Além dessa campanha, organizações locais que atuam diretamente com os povos Yanomami também estão arrecadando recursos. A Hutukara Associação Yanomami vem recolhendo, por exemplo, doações em dinheiro para a compra de alimentos e de ferramentas para a melhoria das roças. 

Em paralelo, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da SIlva (PT) anunciou o planejamento de uma megaoperação para remoção dos garimpeiros da Terra Indígena. Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo na última sexta-feira (27), a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, detalhou que serão operações “emergenciais de saúde, socorro e de fiscalização”. Assim como ações estruturadas para evitar o restabelecimento de atividades predatórias no território. 

“É uma abordagem múltipla. É de saúde pública, de restauração dos modos tradicionais de vida, recuperação dessas áreas, de desintrusão das áreas, de combate ao desmatamento e de retirada do garimpo ilegal. Essa será uma megaoperação que terá de ser feita, planejada, em várias fases”, destacou a ministra. O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) cumpre também, desde domingo, agenda em Boa Vista com o objetivo de apurar situação da crise humanitária que atinge o povo Yanomami. A missão, que vai até a próxima quinta (2), servirá de base para a construção de um relatório que orientará a continuidade das ações do governo. O objetivo é apurar responsabilidades acerca da tragédia humanitária ocorrida na TI Yanomami.

CANTADORES SEM TERRA: ZÉ PINTO E MARQUINHOS NARRAM TRAJETÓRIAS DE MAIS DE 30 ANOS DO MST

Janeiro 29, 2023

  1. CULTURA

CULTURA POPULAR

Em entrevista ao Brasil de Fato, cantadores detalham andanças acompanhados de suas violas pelos quatro cantos do país

Jaqueline Deister

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |

 Janeiro de 2023 –

À esquerda Zé Pinto e à direita Marquinhos Monteiro durante a Jornada de Alfabetização “Sim, Eu Posso” em Maricá (RJ) – Jaqueline Deister/ Brasil de Fato

A luta pela reforma agrária anda de mãos dadas com a música e a poesia. Os chamados cantadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) viajam de norte a sul o Brasil participando de encontros e marchas do movimento, sempre acompanhados de suas violas e repletos de criatividade e sorriso no rosto. E foi em uma dessas andanças que o Brasil de Fato entrevistou os cantores e compositores Zé Pinto e Marquinhos Monteiro. 

Ambos estiveram presentes na Jornada de Alfabetização “Sim, Eu Posso”, que ocorreu no município de Maricá, na região metropolitana do Rio de Janeiro, na última semana.

Zé Pinto, 62 anos, gosta de se apresentar como um poeta popular e apaixonado pela agroecologia. Ele compôs a música “Ordem e Progresso”, considerada a trilha marcante da Marcha Nacional por Emprego, Justiça e Reforma Agrária iniciada no dia 17 de fevereiro de 1997. Na ocasião, os sem terra partiram em caminhada de três pontos do país para chegar a Brasília para um protesto no dia 17 de abril, exatamente um ano depois do Massacre de Eldorado do Carajás.

A música que acompanhou os militantes ao longo dos dois meses de caminhada foi composta por Zé Pinto e eternizada, posteriormente, pela voz de Beth Carvalho, é a síntese da missão do maior movimento popular organizado do país. 

O “cantador” é mineiro, mas a família mudou-se para o norte do país ainda nos anos 1970 e foi no estado de Rondônia, há 36 anos, que Zé conheceu o MST. O primeiro contato foi como “zelador” do jornal do movimento, termo usado para a pessoa responsável pelas assinaturas do informativo.

Pouco tempo depois, o contato com os temas da reforma agrária e agroecologia, passaram a render letras e canções. “Depois, quando eu comecei a participar do movimento fui fazendo as músicas dentro dessa realidade da luta que a gente está participando”, conta. 

Assim como Zé, Marquinhos Monteiro esbanja criatividade com as palavras e cifras. Aos 48 anos, o capixaba vive atualmente no Piauí e está no MST há 31 anos. Cursou administração no sul do país, trabalhou como coordenador de cooperativa e também esteve à frente do projeto “Sim, Eu Posso” no estado do Maranhão. A propósito, Marquinhos é o compositor do hino da iniciativa de erradicação do analfabetismo promovida pelo MST.

“Acompanhei 15 municípios, eram mais ou menos 20 mil pessoas. E eu tive o privilégio de ouvir falas como a de uma senhorinha que me disse que o maior sonho dela era conversar com as letras. Eu fiz uma canção em cima disso  ‘Quando se aprende a ler, o que eu não via eu passo a enxergar, se conversarmos com as letras, nós viajamos sem sair do lugar’”, relembra. 

Confira a entrevista com Zé Pinto e Marquinhos Monteiro: 

Quando começou a relação de vocês com o MST?

Zé: Eu participava de um grupo de jovens de uma igreja bem progressista e isso já na região amazônica, em Rondônia. Então, o MST chegou com um curso e eu fui convidado para participar, em 1986, e me deram a tarefa de zelador do jornal. Na época, o jornal do MST. 

Em cada região tinha o zelador que saia fazendo assinatura, tinha que chegar e entregar para todo mundo que assinou. E eu, uma vez, fui o campeão de assinaturas em Rondônia. Fui fera e dai não parei mais. Já mudei para Minas Gerais, fiquei seis anos lá. Depois fomos para o Rio Grande do Sul, ficamos mais três anos, depois voltamos para Rondônia de novo. Sou do coletivo de cultura do movimento.

Marquinhos: Em 1992, o movimento fez o curso TAC [Técnicas de Administração em Associativismo e Cooperativismo], e eu fui convidado para participar, mas nem sabia o que era o movimento, a gente era meeiro, trabalhava com café e pimenta-do-reino. Fiquei curioso e parei meu curso técnico na escola de família agrícola e fui fazer um curso do movimento no Braga, no Rio Grande do Sul. 

Trabalhei como administrador em algumas cooperativas, supermercados que o movimento começou nesse período no Espirito Santo e depois eu fui morar em Aracaju, morei cinco anos e depois eu fui para o Piauí para discutir um curso de artes com o pessoal. E ai eu fui ficando, ficando e já estou há 17,18 anos morando no Piauí. 

E como se tornaram músicos do movimento?

Zé: As músicas no começo, quando eu comecei a compor, não diziam nada. Essas coisinhas quando a gente toma um chute da namorada (risos). Depois, quando eu comecei a participar do movimento fui fazendo as músicas dentro dessa realidade da luta que a gente está participando. A gente participa de muita palestra, um pessoal muito bom e escuta uma palavra e vai para o caderninho escrever, é a música que está nascendo. É uma peleja, mas é um negócio muito bom porque você vai doando o que consegue compor, recebendo mensagens interessantes e participando também.

Marquinhos: Eu comecei a tocar mesmo no movimento uma vez que eu fui na Bahia e o Zé Pinto não foi. Eu cheguei lá no encontro de jovens e o Zé furou (risos) e eu nem imaginava. Toquei algumas músicas e o pessoal me colocou no coletivo de cultura e de lá para cá nunca mais parei. Isso foi em 97, 98. 

E Zé, você chegou a fazer uma música para um aniversário do Brasil de Fato?

Zé: Foi muito bom, eu participei desse evento do aniversário do Brasil de Fato, pediram para eu fazer uma música, eu fiz. Gravamos e foi bem legal. Me deram uns toques do que tinha que ter na música. Só que era uma música para aquele momento conjuntural, há 10 anos, ai se perde.

Marquinhos, dentre as suas composições está o hino para o projeto de erradicação do analfabetismo do MST, o “Sim, Eu Posso”. Como que foi esse processo?

Marquinhos: No Maranhão, começou em 2016. Porque eu moro próximo do Maranhão, o que me divide é só o Rio Parnaíba. Eu não fiz parte do “Sim, Eu Posso!” na ocasião, mas eu recebi informações da turma que estava começando e eu comecei a compor algumas canções para o  projeto. E uma das canções, eu tive o privilégio de ficar como hino do “Sim, Eu Posso”, que é uma canção que se chama “O Povo é Movimento”.

Em 2017 eu comecei a fazer parte da equipe do projeto. Eu era o coordenador de município e decidiram que eu acompanharia 15 municípios, pude ter uma vivência muito próxima das pessoas e nessa vivência eu consegui fazer seis músicas. 

Eram mais ou menos 20 mil pessoas. E eu tive o privilégio de ouvir falas como a de uma senhorinha que me disse que o maior sonho dela era conversar com as letras. Eu fiz uma canção em cima disso: ” Quando se aprende a ler, o que eu não via eu passo a enxergar, se conversarmos com as letras, nós viajamos sem sair do lugar”. Depois eu fui mostrar para ela, olha a sua frase está aqui, transformada em canção. 

O que vocês destacariam dentro do trabalho musical autoral que fizeram até hoje? 

Zé: Eu escrevi “Ordem e Progresso” que é muito cantada, foi na primeira marcha do movimento que ela foi nascendo e eu fui ensaiando com o povo nas horas de descanso, com a galera mais animada e quando chegou em Brasília já estava todo mundo cantando. Eu escrevi muitas músicas para a questão agrária, para a agroecologia. O movimento está muito preocupado com essa luta contra o veneno, então, é tudo o que a gente quer é ouvir, participar e escrever.

Marquinhos: Têm duas canções que eu gosto muito, essa do “Sim, Eu Posso” e uma canção que eu fiz para os sem-terrinha: ”Sem terrinha em movimento, brincar, sorrir e lutar, por reforma agrária popular”. Desenvolvi brincadeiras dentro da canção que eu gosto para caramba. 

Fonte: BdF Rio de Janeiro

Edição: Mariana Pitasse

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LENDA DE RATAMBUFE: CONHEÇA O BOI DE CONCHAS DE UBATUBA, NO LITORAL PAULISTA

Janeiro 28, 2023

  1. MOSAICO CULTURAL

FOLCLORE

Criada em 2003, manifestação cultural já caiu no gosto popular e leva alegria às ruas da cidade duas vezes ao ano

Adrielly Marcelino* e Vanessa Nicolav

28 de Janeiro de 2023 –

Ouça o áudio:Play

03:30

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Ilustração do boizinho Ratambufe, mais conhecido como o Boi de Conchas – Divulgação/Associação Boi de Conchas

Um boi sonhador que transformou a própria vida, ao invés de seguir o caminho traçado pelo por outros

Um boizinho branco que fugiu de seu destino do abate e foi viver no mar, de onde retorna cheio de conchas assim que escuta a cantoria, o chamando na beira da praia. Essa é a história do boizinho Ratambufe, lenda criada pelo artista popular de Ubatuba, Júlio Mendes, que é encenada todos os anos nas ruas da cidade.

A ideia da montagem dessa espécie de Ópera de rua caiçara partiu do dramaturgo Bado Todão, quando ele participava, com Júlio, do movimento cultural chamado Pirão Geral.

Todão, dramaturgo e ator, viajou pelo Brasil e pelo exterior trabalhando com o teatro popular até retornar para a sua terra natal, Ubatuba, no litoral paulista, no início dos anos 2000. Foi nessa época que estava no Movimento Cultural Pirão Geral, que reunia diversas expressões e artistas nas terras ubatubenses. 

O Pirão Geral foi extinto, mas foi exatamente dessa cena cultural que nasceu, em 2003, o Boizinho Ratambufe, mais conhecido como o Boi de Conchas. A manifestação retrata um animal imaginário que desapareceu na praia de Iperoig. Enquanto festividade, o Boi de Conchas nasceu na Praça Nóbrega, bem no centro da cidade de Ubatuba. 

“Nós pegamos uma lenda, uma história, daquela ocasião colhida e reinventada pelo Julinho Mendes, um companheiro de trabalho de cultura popular aqui de Ubatuba. E a partir daí a gente criou essa manifestação pública popular, desse boi que nasceu em São Luiz de Paraitinga e depois foi levado para Ubatuba”, recorda o artista. 

Todão define aquele movimento como libertário, “de rua, na frente de um sebo de livros, que era da minha propriedade, e a gente e a gente ali fazer uma manifestação. E a ideia ela tá ali fomentar a caráter público e poder contar as nossas histórias. E ali foi-se construindo um pouco essa dramaturgia do boi, do auto do Boi de Conchas. Em função dessa instigação de ter lido e me chamado muita atenção àquela história universal, um boi sonhador que transformou a própria vida, ao invés de seguir um caminho traçado pelo por outros”, acrescenta. 



Mas, afinal, porque Ratambufe e Boi de Conchas? Ou seja, dois nomes para o mesmo personagem? Que tal conhecer um pouco no enredo dessa história-lenda para entender?

Conhecendo o Boi de Conchas

A professora e contadora de histórias Mariza Taguada conta a lenda do Boi de Conchas – confira os contos de Mariza no YouTube

Enredo

Tudo começa com o tropeiro Cipriano, que tinha um sítio no alto da serra. Ele descia para Ubatuba para vender seus produtos e apreciar o mar. Foi no Dia de São Pedro, Pescador, que nasceu Ratambufe, um boizinho todo branco, de rabo preto e marca de concha na testa.

:: Serpente da Ilha do Fogo, Nego D’agua, duendes e lobisomens: as lendas do Velho Chico ::

Ratambufe cresceu ouvindo as histórias que Cipriano contava sobre o mar, azul, cheio de peixes, sereias e baleias.

Mas o sonho de ver a água azul na verdade escondia a realidade dos planos de Cipriano levar o boi para o açougue. 

É daí que, a caminho do matadouro, Ratambufe foge e mergulha com alegria até sumir no fundo do mar. Tempos depois Ratambufe ressurge da praia ao ouvir uma viola.  

O animal que reaparece passa a ser chamado como Boi de Conchas. Pelo próprio nome, é possível imaginar um boi coberto por conchas.



Música

Ao mesmo tempo, a referência da palavra ratambufe realça um instrumento musical, criado por Domingos Anagro, um folião de Ubatuba. Uma espécie de berimbau adaptado.  


Bado Todão segurando o instrumento musical ratambufe / CRUMI 

“Ratambufe foi o nome dado ao boizinho nascituro. Ele nasceu no dia de São Pedro Pescador. E o ratambufe nada mais é que um berimbau de lata. Um instrumento feito com um bastão, uma biriba, um bastão que enverga né. Um arame e uma lata”, explica Bado Todão. 

Uma das pessoas que é símbolo da resistência cultural do Boi de Conchas é Ana Carolina Sorrentino. Desde os 3 anos de idade, ela participa da manifestação. O boi foi inspiração para a carreira de Carolina, que trabalha hoje como atriz. Ela defende a importância da festa para a cidade.

“Quando as pessoas olham o Boi de Conchas, eles se lembram desse período em que Ubatuba era humilde, era pequeno, quando as pessoas todas se conheciam. E querendo ou não o Boi faz com que as pessoas todas se conheçam, naquela bolha, infelizmente não é tudo, mas grande parte de Ubatuba conhece, e isso é muito muito importante a gente tem um ponto de identificação, né?, destaca.

Nos dias 28 de junho, quando se comemora o dia do Pescador, e em 29 de outubro, aniversário da cidade, o boi sempre volta a aparecer, trazendo sonhos, alegria e vontade de resistência para o povo de Ubatuba.

Edição: Douglas Matos e Daniel Lamir

BOATE KISS: “ESQUECER É NEGAR A HISTÓRIA”, DEFENDE AUTORA DO LIVRO “TODO DIA A MESMA COISA”

Janeiro 27, 2023

Livro da jornalista Daniela Arbex deu origem à série homônima sobre incêndio que matou 242 em 2013, em Santa Maria (RS)

Mariana Lemos e Geisa Marques

27 de Janeiro de 2023 –

Ouça o áudio:Play

33:59

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Dez anos após o crime da boate Kiss, que tirou a vida de 242 pessoas, famílias lutam por justiça – Fernando Frazão/ Agência Brasil

O silenciamento só beneficia os réus e a impunidade

O dia 27 de janeiro marca uma das maiores tragédias coletivas do país: o incêndio que matou 242 pessoas na boate Kiss, em Santa Maria (RS). Dez anos se passaram e até hoje as famílias das vítimas seguem em luta por justiça e memória. Até o momento, apenas os familiares foram punidos – não pela justiça, mas pelo sofrimento que carregam há uma década enquanto lutam para que os culpados sejam responsabilizados.

Para a jornalista Daniela Arbex, o episódio trágico é resultado de uma “sucessão de omissões e equívocos”. Ela é autora do livro reportagem Todo Dia a Mesma Noite, que inspirou a série com o mesmo nome que estreou nesta semana na plataforma de streaming Netflix.

Em entrevista ao programa Bem Viver desta sexta-feira (27), da Rádio Brasil de Fato, a escritora defende que a história seja contada e recontada, para que não se repita. “Eu comecei a ouvir, a oferecer essa escuta qualificada, relatos muito potentes, muito importantes, que me fizeram entender a necessidade da urgência de se construir a memória coletiva do Brasil. Porque esquecer é negar a história. E quando se esquece, a gente repete os erros do passado“, afirma.

A provocação para escrever o livro partiu de um colega de Daniela. Ela conta que, em um primeiro momento, ficou relutante a escrever sobre o caso. Afinal, a tragédia teve ampla cobertura da mídia, e os fatos já haviam sido contados a partir da ótica de diversos personagens. A decisão de documentar o episódio por meio da obra jornalística veio após a escritora se dar conta de que as narrativas ainda não estavam completas.

“Resolvi pesquisar nas redes sociais o que as famílias estavam falando. Caí numa página em que um dos sócios da boate se lamentava por não poder comemorar o aniversário dele. Então, uma mãe escreveu: ‘você não comemora mais o seu aniversário? E a minha filha que foi comemorar o aniversário de 22 anos com quatro amigas, e nenhuma delas voltou pra casa?’ Eu fiquei atravessada. Isso me tocou de uma forma tão intensa que eu entrei em contato com essa mãe, e fui pra Santa Maria. Quando eu cheguei lá, comecei a perceber que as pessoas não tinham contado todas as suas experiências sobre o que foi aquela noite. Por exemplo, os profissionais da área da saúde”, relata a jornalista. 

Críticas

Daniela Arbex é uma jornalista investigativa premiada e de longa carreira na profissão. Ainda assim, não está isenta das críticas pelo seu trabalho. A estreia da série televisiva, por exemplo, suscitou críticas por rememorar a dor das famílias que perderam entes queridos naquela noite de 27 de janeiro.

“O que adianta contar essa história se não vai trazer esses meninos de volta?” Esse foi um dos questionamentos ouvidos pela escritora, que reitera a necessidade da construção da memória para que “outros meninos cheguem em segurança em casa.”

“Eu acho que a gente precisa olhar para o passado não pra ficar preso a ele, mas para que a gente possa repensar o presente para transformar o futuro. Então não dá pra gente continuar fingindo que nada aconteceu. O silenciamento só beneficia os réus e a impunidade”, conclui.

Responsabilização

Familiares e vítimas do incêndio da boate Kiss ainda aguardam respostas da Justiça. Em 2021, quatro pessoas foram acusadas de homicídio pelo Ministério Público do Estado (MPE-RS), sendo eles dois sócios da casa, um cantor e o ajudante da banda que se apresentava na ocasião. Elas foram condenadas pelo Tribunal do Júri a penas de 18 a 22 anos de prisão. O Tribunal de Justiça, no entanto, anulou a sentença e revogou a prisão em agosto do ano passado sob o argumento de descumprimento de regras na formação do Conselho de Sentença.

Segundo o Ministério Público do Rio Grande do Sul, além dos quatro réus por homicídio, 19 pessoas, entre bombeiros e ex-sócios da boate, foram acusadas por crimes como falsidade ideológica e negligência.

Outras 27 pessoas foram denunciadas por falsidade ideológica, porque assinaram documento dizendo morar a menos de 100 metros da boate, o que foi comprovado como mentira.

O então prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (citado no áudio da entrevista com Daniela Arbex), chegou a ser indiciado no inquérito policial, mas não foi denunciado pelo Ministério Público. O Brasil de Fato entrou em contato com a assessoria, mas não obteve retorno.

WALNICE NOGUEIRA GALVÃO: SAMBA MACARRÔNICO (2)

Janeiro 26, 2023

História do Brasil e Samba do crioulo doido. Ambos efetuam um processo de carnavalização que incide mais sobre o significado

Walnice Nogueira Galvãojornalggn@gmail.com

Janeiro de 2023 –

Samba macarrônico (2)

por Walnice Nogueira Galvão

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Se entendermos “macarrônico” no sentido mais amplo, poderemos incluir duas composições que não o são apenas na linguagem, mas sobretudo no entrecho: História do Brasil Samba do crioulo doido. Ambos efetuam um processo de carnavalização que incide mais sobre o significado, ao contrário das composições de Adoniran Barbosa que são macarrônicas no significante, quando utilizam a linguagem corrompida. Quem quiser se enfronhar mais neste assunto, pode contar com a excelente tese de Rachel Valença, Palavras de purpurina: estudo linguístico do samba-enredo. Ali, a pesquisadora da Casa de Rui Barbosa e membro da Velha Guarda do Império Serrano mostra a compatibilidade entre as empoladas letras do samba-enredo e as cintilações dos paramentos do desfile.

Estes que examinamos hoje são delirantes, alucinatórios, anárquicos, surrealistas mesmo. Cortejam a incongruência definida por Lautréamont e apropriada pelos poetas surrealistas: “Belo como  o encontro fortuito, sobre uma mesa de dissecção, de uma máquina de costura e um guarda-chuva.”

Um deles, aliás não um samba mas uma marchinha, leva o atrevido título de História do Brasil. Seu autor, Lamartine Babo, é um dos mais extraordinários compositores de música popular que já houve entre nós, de uma fecundidade fora do comum, que emplacava marchinhas de sucesso em todo carnaval. Ele mesmo era um folião fanático, sempre fantasiado de “Viúva”: sedas negras, rosto sob véus, luvas rendadas. E não compunha só marchinhas, também compôs música clássica, canções para teatro de revista e um hino para cada clube de futebol do Rio de Janeiro. Grande boêmio mas grande trabalhador, tinha dez empregos ao mesmo tempo, atuando no rádio, no jornal, no teatro, nos concursos populares, chegando até os primórdios da televisão. Seu traço fundamental é a irreverência. Mas vamos à História do Brasil.

Começa pela pergunta: “Quem foi que inventou o Brasil?”, quando na escola nós todos aprendemos que o Brasil não foi inventado mas descoberto. E logo responde:

“Foi seu Cabral! Foi seu Cabral!”

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E em que data?

“No dia 21 de abril

Dois meses depois do Carnaval”

É notável: a data de fundação da nação é o Carnaval, e não o descobrimento…

Depois, continua trazendo à tona os ícones da pátria:

“Depois Ceci beijou Peri

Peri beijou Ceci

Ao som, ao som do Guarani.

Do Guarani ao guaraná

surgiu a feijoada

E depois o parati”

Esses ícones são: os protagonistas da ópera indianista de Carlos Gomes; o refrigerante típico do Brasil; a feijoada; e a cachaça, ou parati, como então se dizia. Hoje diríamos que faltou apenas o futebol, porque o samba está subsumido no Carnaval. E não termina aí.

Três décadas depois (1934-1968) surgiria outro, o Samba do crioulo doido, da autoria de Sérgio Porto, sob o pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta. Mais minucioso em sua porfiada paródia de um samba-enredo, vai com deliberação carnavalizar os ícones da pátria. A premissa de base é a conhecida obrigatoriedade de que o samba-enredo para o desfile no Carnaval deve tratar temas da História do Brasil. Donde os maiores absurdos.

Uma trama complicadíssima vai pôr em cena Juscelino Kubitschek, Diamantina, a princesa Leopoldina, Chica da Silva, Tiradentes, Anchieta, D. Pedro II, e assim por diante. De absurdo em absurdo, o samba termina por celebrar a Proclamação da Escravidão, devidamente atribuída a seus autores, anteriormente mencionados, Tiradentes e Pedro II, este último o título com que Anchieta “se elegeu”:

“Da união deles dois ficou resolvida a questão

E foi proclamada a escravidão!”

Além de serem boas composições, tanto a marchinha quanto o samba são divertidíssimos, inteligentes e de balanço irresistível. Operam comentário sagaz à solenidade do samba-enredo e aprofundam os sentidos da carnavalização.

Walnice Nogueira Galvão é Professora Emérita da FFLCH-USP

EDITAL DARCY RIBEIRO CONTEMPLA 5 PROJETOS E ABRE EXPOSIÇÃO SOBRE O ANTROPÓLOGO NO RIO

Janeiro 25, 2023

  1. CULTURA

100 ANOS

Projetos selecionados foram elaborados por produtores culturais fluminenses envolvendo a obra e vida do pesquisador

Redação

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |

 25 de Janeiro de 2023 –

Um dos cinco projetos contemplados foi o espetáculo teatral “Cartas de Darcy”, do grupo Poeira da História. – Reprodução

O edital “100 Anos Darcy Ribeiro” organizado pela Secretaria de Estado e Cultura do Rio de Janeiro selecionou cinco projetos de produtores culturais fluminenses envolvendo a obra e vida do antropólogo. Cada um deles vai receber R$ 50 mil para ser desenvolvido.

Ao todo, o júri recebeu e avaliou 191 propostas criativas. A representatividade foi um dos critérios utilizados no processo de seleção e refletiu no perfil dos candidatos às vagas. Do total, 94,2% dos projetos inscritos contavam com mulheres; 78%, com negros; 61,3%, com representantes LGBTQIA+; e 15,7%, com pessoas com deficiência. Outros 42 tinham indígenas dentro de sua equipe.

Um dos cinco projetos contemplados foi o espetáculo teatral “Cartas de Darcy”, do grupo Poeira da História. Na peça, Darcy acorda de um sono profundo e se pergunta: “Em que ano estamos?”. Ao se deparar com as informações, ele precisa lidar com um novo país e decide escrever cartas ao Brasil de hoje.

Os outros projetos vencedores foram “Cortejo Favela – Os Brasis de Darcy”, “Darcy Ribeiro do Brasil – Um Documento Narrado”, “Mural Darcy Ribeiro e o Povo Brasileiro” e “O Brasil de Darcy Ribeiro para Crianças”.

Exposição

Com o anúncio dos contemplados no edital, durante uma cerimônia na Biblioteca Parque Estadual na última segunda-feira (23), também foi inaugurada uma exposição sobre o centenário de Darcy. 

A exposição está em cartaz até 3 de março na Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa, que fica no segundo andar da Biblioteca Parque,e m uma instalação inédita que foi criada por Matheus Amorim e incorporada às festividades em torno do antropólogo.


Em formato circular e com 24 quadros, a estrutura de ferro recebe uma linha do tempo cronológica/ Divulgação

Em formato circular e com 24 quadros, a estrutura de ferro recebe uma linha do tempo cronológica com texto biográfico e fotografias de momentos de destaque na trajetória do homenageado. Uma TV transmite extratos do Quarup, uma homenagem indígena póstuma recebida por Darcy, com curadoria de Milton Guran, o criador e responsável pelo FotoRio, maior evento de fotografia da cidade desde 2003. A entrada é gratuita.

Serviço 

Local: Biblioteca Parque Estadual – Rua Presidente Vargas, 1261, Centro

Visitação: Até 3 de março

Para participar da visita guiada, basta solicitar no balcão de atendimento da BPE ou agendar com antecedência através do e-mail (agendavisitabpe@cultura.rj.gov.br) ou pelo telefone (21) 2216-8501. Os horários disponíveis são: de segunda a sexta, às 11h, às 14h e às 16h.

Fonte: BdF Rio de Janeiro

Edição: Mariana Pitasse

OBRAS DE ARTE RESTAURADAS TERÃO MENSAGEM MEMORIAL DE ATAQUE À DEMOCRACIA

Janeiro 24, 2023

Todas as obras trarão uma mensagem, no estilo de memorial, em lembrança ao dia da tentativa de golpe dos bolsonaristas

Patricia Faermannjornalggn@gmail.com

24 de janeiro de 2023 –

As obras de arte destruídas no 8 de janeiro serão restauradas com a referência da tentativa de golpe dos bolsonaristas. A lembrança aos ataques à democracia estará presente nas descrições das obras, informou o curador dos Palácios Presidenciais, Rogério Carvalho.

Carvalho é arquiteto, atuou no Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e, em 2007, durante o governo Lula, foi o responsável por tombar o Palácio do Planalto e obras de arte de Brasília. Com o novo governo de Lula, ele foi escolhido diretor de Curadoria dos Palácios Presidenciais.

Um dia após os ataques a Brasilia, depois de visitar os estragos deixados pelos bolsonaristas, o curador narrou que as perdas com os danos eram incalculáveis.

“Eu tinha acabado de montar, na sexta-feira, o 3º andar, remontamos a sala do presidente e a gente teve, realmente, muito vandalismo. Temos uma situação como a tela do Di Cavalcanti, enorme e muito importante, rasgada em 7 pontos”, narrava, em áudio divulgado pelo GGN.

https://jornalggn.com.br/politica/a-destruicao-do-patrimonio-historico-no-palacio/embed/#?secret=EvJlAQ3cf0#?secret=iZM7dXmg3d

Ao Uol, ele narrou como tem sido o andamento dos trabalhos. Afirmou que os cálculos dos danos às obras ainda estão sendo contabilizados, podendo chegar a R$ 40 milhões, para restaurar as 17 obras atacadas pelos bolsonaristas.

Carvalho também informou que as obras, perfuradas, rasgadas e quebradas, estão estáveis e será possível recuperá-las. Uma decisão de Lula, contudo, já está tomada: todas as obras trarão uma mensagem, no estilo de memorial, em lembrança ao dia do ataque à democracia.

“Essa obra (restaurada) terá ali descrito: ela sofreu no dia 8 de janeiro sete perfurações, num ato de vandalização e de questionamento à democracia”, contou o curador.

Após as restaurações, as obras retornarão aos espaços do Planalto ou Alvorada e abertas a visitação, “devolvidas ao povo brasileiro”, teria pedido Lula a ele.

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AFTERSUN: O AMOR NAS AMBIVALÊNCIAS DA MEMÓRIA

Janeiro 23, 2023

Filme de Charlotte Wells revisita, nas incertezas das recordações de uma viagem de férias, a difícil conexão entre pai e filha. Em intrincada elaboração, a câmera busca os fragmentos do vivido – latentes, mas que escapolem fora do plano

OUTRASPALAVRAS

POÉTICAS

Por Pedro Pennycook

23/01/2023 –

Não é de hoje que costumamos dar à infância lugar privilegiado na análise de nossas vidas. Ainda que memórias cotidianas possam ter e tenham efeitos concretos no modo como agimos, as experiências infantis parecem resguardar algo da gramática fundamental pela qual aprendemos a desejar e, por conseguinte, falarmos sobre nós. Muito mais vezes do que gostamos de imaginar, no entanto, essa gramática funciona como uma prisão existencial: ela refreia nossa capacidade de elaboração diante do que outrora não tivemos capacidade de expressar em palavras, de imagens desconexas que não se teceram enquanto narrativa.

O longa de estreia de Charlotte Wells pode ser entendido como uma visita a – senão um acerto de contas com – sua própria infância. Ao elaborar por meio da ficção uma viagem de férias com seu pai, a diretora, cuja presença se corporifica na trama através da pequena Sophie, reencontra os gestos de uma vida que começa a ensaiar voz própria. Dentre os primeiros olhares e gestos curiosos, ainda que desencontrados, com um grupo de turistas mais velhos e que lhe chamam a atenção, até as suas tentativas de documentar a viagem com uma câmera de vídeo, Sophie busca sobretudo se conectar com o pai.

O cinema parece ter sido desde muito cedo seu principal meio para tal. Não como se as lentes lhe permitissem recordar aquilo que não foi capaz de o fazer por meio dos olhos, e sim como a maneira de deixá-los demorar sobre a realidade até que nela reencontrem a capacidade do encanto. Boa parte dos enquadramentos nas cenas parecem confirmar essa necessidade, que à época parecia tão imediata quanto hoje se revolve numa busca angustiada pelos fragmentos de memória que escapuliram pelos cantos do take.

A câmera captura gestos aparentemente cotidianos – as danças embaraçosas dos pais, os primeiros beijos ainda descoordenados, o esboço de um olhar não correspondido, a inadequação e o estranhamento de não saber nadar quando já se sonha com mergulhos profundos. Ela os captura e parece devolvê-los com a dignidade do inusitado, assim como a infância é sempre o tempo onde os gestos banais ainda podem parecer tão primeiros e espantosos.

Mas há sempre algo que escapa à suposta onipresença da câmera. Assim como quando pergunta a Calum, seu pai, sobre o que ele teria desejado fazer caso novamente tivesse 11 anos, ou por que os adultos aprendem a falar “eu te amo” quando já não mais sabem outra coisa para falar em troca, Sophie se depara com os escombros de uma memória sempre fadada a ser incompleta.

Pois subjaz um mistério sob os momentos que nos serão decisivos. Quando Freud pensou a relação entre nossa vida inconsciente e sua elaboração simbólica, ainda sob o signo da transição do excesso de afeto à adesão semântica com a qual adquiriríamos agência sobre nossos traumas, ele chamou a esse funcionamento específico de significação de a posteriori. Era questão de lembrar como lá onde mais nos pensávamos donos de nós mesmos, lá onde a história já teria sido escrita em dados irretocáveis e objetivamente anexados, pairava uma inconstância fundamental. A memória está sempre à mercê de sua significação tardia – e das conexões que traçamos para através delas narrarmos nossas histórias, sempre por se atualizar.

Esse parece ser o caso quando somos convidados à sua vida no presente. Mostrada em duas sucessões não-convergentes de cortes, a Sophie de 31 anos – mesma idade que tinha seu pai quando da viagem – parece buscá-lo na imensidão escura de seus próprios trechos de recordações. Entre os clarões e trechos que consegue alcançar, são os gestos de seu pai que lhe permitem identificá-lo em meio ao anonimato superpovoado da pista de dança. É da dança que outrora lhe envergonhava em seu pai que Sophie vai ao encontro; e como quem se desespera com o infamiliar que rebole em lembranças, ao mesmo tempo num abraço desesperado e na queda com a qual seu pai novamente lhe escapa, ela se perde no silêncio do desencontro.

Pois talvez seja o caso de que nossas memórias jamais se conciliem numa linearidade. Se Sophie não consegue fazer convergir abraço e queda é porque ambos expressam aspectos de seu pai que jamais poderia conhecer por completo. Não há totalidade na memória – e como mais tarde ela parece perceber, nem mesmo nossa infância parece imune a se ver despossuída de qualquer certificação.

Calum, por sua vez, tampouco parece saber lidar com essa incerteza. Embora Wells decida – acertadamente – não nos contar muito de seu passado, sabemos que ele se divorciou da mãe de Sophie e já não mora mais em sua cidade-natal, Edimburgo. Apesar dos esforços e da inegável doçura com a qual a trata, o personagem parece incapaz de se sintonizar com sua filha e os impasses próprios a idade. Como se evidencia quando o vemos aos prantos, Calum parece chorar sobretudo uma infância duplamente não-vivida. Primeiro, a sua própria, como parece ser o caso a partir das pequenas pistas que o filme nos fornece. Mais decisivamente, a de sua filha, cuja curiosidade pela vida do pai parece sempre esbarrar na dificuldade deste em permitir-lhe habitar suas fragilidades.

Ainda assim, resta a Wells o silêncio de quem amou sem precisar desvendar o todo. Como o a posteriori de que falava Freud, tal elaboração permite-nos não uma posse da totalidade, mas certa abertura para saltar na construção contínua de uma subjetividade que transborde nossos primeiros gestos de amor. O amor ocorre exatamente nesse deslize, na discordância entre as fatalidades que julgamos impossíveis de remediar e a força de elaboração do que jamais poderemos desvendar por inteiro. Ele resta como o vínculo fundamental que nos enlaça aos que escapam de serem totalmente nossos, mas que jamais deixaremos de procurar em nossas infâncias.

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PREFEITURA DE BH CONVOCA CAPOEIRISTAS PARA PESQUISA E PRÁTICA PODE VIRAR PATRIMÔNIO DA CIDADE

Janeiro 22, 2023

CULTURA

Processo, construído com entidades do setor, visa políticas de fortalecimento da capoeira na capital

Amélia Gomes

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |

 22 de Janeiro de 2023 –

Na foto, roda de capoeira acontece na Praça Sete, centro de BH, em homenagem a Mestre Moa – Foto: Carina Castro

Em pontos tradicionais de Belo Horizonte, como a Feira Hippie, a Praça Sete e o Parque Municipal, é comum encontrar rodas de capoeira. Para conhecer melhor esse segmento cultural, a Prefeitura de Belo Horizonte realiza um mapeamento do setor. O objetivo da pesquisa é identificar como o Executivo pode contribuir para fortalecer a prática na cidade e coletar dados e informações para o pedido de registro da capoeira como patrimônio imaterial da capital.

Álan Pires, coordenador de patrimônio imaterial da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte, explica que a iniciativa é fruto do Plano Municipal de Promoção da Igualdade Racial. “É um exercício de aproximação, de convite à discussão das políticas culturais para esse segmento”, conta. Pires afirma que o principal desafio tem sido vencer o receio dos mestres, que durante anos foram excluídos dos lugares de poder e tomada de decisão na cidade.

Até o momento, o levantamento, realizado desde 2021, apontou a existência de 26 mestres na cidade, sendo duas mulheres, 64 grupos de capoeira e 350 participantes. Mas a estimativa é que os números sejam muito maiores. Por isso, o levantamento segue aberto. “Nosso objetivo é fazer com que os capoeiristas passem a discutir qual é a importância das políticas culturais sobre as suas práticas, e como a capoeira pode ajudar no desenvolvimento da cultura, do turismo e da educação em Belo Horizonte”, aponta.

Tanto a elaboração do formulário do mapeamento, quanto os debates em torno das políticas que poderão ser construídas a partir dos dados, estão sendo elaborados com entidades do setor, como o Fórum da Capoeira de Belo Horizonte.

Mestre Primo, membro do Fórum, é um dos articuladores da iniciativa. Ele espera que, além do reconhecimento como patrimônio, o levantamento se desdobre em benefícios ao setor, como a criação de um espaço coletivo destinado à capoeira em Belo Horizonte. “Um espaço onde nós possamos nos encontrar, fazer eventos e continuar discutindo políticas para a categoria. A gente precisa desse espaço, é uma reivindicação antiga do nosso povo”, anseia.

Um pouco de história

Os estudos já realizados pela prefeitura em parceria com entidades de capoeiristas de Belo Horizonte mostram que a prática ganhou força na cidade no final da década de 1960.  Há indícios de que a famosa Feira Hippie de Belo Horizonte tenha surgido a partir de uma roda organizada nessa mesma época.

Para o Mestre Daniel, que há mais de 30 anos é praticante da atividade, a capoeira representa ancestralidade, cultura e resistência. Uma herança que pretende deixar aos seus discípulos.

“Como dizia mestre Valdemar, tudo que eu tenho eu quero deixar. Essa frase é muito forte e nós capoeiristas temos que pensar dessa forma. A minha maior missão é preservar e manter a nossa ancestralidade e a nossa cultura”, ressalta Mestre Daniel, que também é construtor de instrumentos e educador social.

Serviço:

Os espaços culturais de Belo Horizonte estão aptos a tirar dúvidas e orientar os interessados sobre o preenchimento dos formulários do mapeamento sobre a capoeira. Abaixo estão os formulários específicos para cada categoria:

Praticantes de Capoeira – clique aqui   

Grupo de Capoeira – clique aqui   

Mestres e Mestras de capoeira – clique aqui   

Mais informações sobre o levantamento estão disponíveis no site da Prefeitura de Belo Horizonte.

Fonte: BdF Minas Gerais

Edição: Larissa Costa