Projeto “Mar de Vozes” foi lançado nessa sexta-feira (29) com a interpretação da música “Alguém Cantando”
Stela PastoreBrasil de Fato | Porto Alegre | 31 de Janeiro de 2021.
Em maio de 2020, em meio a pandemia, o arquiteto e ex-coralista Marcel Gusmão propôs nas suas redes sociais formar um coral virtual para que cada um cantasse na sua casa e enviasse as gravações de áudio e vídeo para serem editadas e reunidas em estúdio.
“Reunimos 35 cantores. A sua grande maioria remanescentes do Coral da Unisinos das décadas de 1980 e 1990, numa reinterpretação do lindo arranjo de Marcos Leite para a música Alguém Cantando, de Caetano Veloso. Foram nove meses de um trabalho amoroso, que reaproximou amizades de mais de 30 anos e consolidou novos vínculos entre pessoas dos mais diversos cantos do país num período de crise sanitária e humanitária”, conta Gusmão.
O trabalho foi lançado nesta sexta-feira (29), nas redes sociais. Batizado de Mar de Vozes, o projeto sem fins lucrativos, coordenado por Marcel Gusmão, reuniu amantes do canto coral sob a regência e direção musical de Vera Novack, que gravou as vozes e o piano para cada um dos naipes e fez os ensaios em salas de bate-papo. Acolheu todos os arquivos de vozes e deu atenção a cada peculiaridade do grupo.
A orientadora musical Lúcia Passos, que por muitos anos ensaiou o coral Unisinos ao lado do maestro José Pedro Boéssio (in memorian), novamente emocionou os cantores ao gravar os exercícios de aquecimento vocal para desenferrujar muitas vozes que já não cantavam há muito tempo. Ela é a homenageada especial do grupo. “Que lindo e emocionante! É a história viva trazida ao coração de todos, num momento de união, mesmo à distância! Lindo de ver e ouvir! Parabéns!”, disse após o lançamento.
Caetano Veloso
O músico Caetano Veloso assistiu ao clipe e escreveu para o grupo no dia 19 de janeiro. “Adorei tudo. As pessoas cantando junto de novo. Uma beleza. A letra da minha canção. Nicinha está linda ali como epígrafe escrita. Nem precisa ser falada. Acho até que falar possa atrapalhar a limpidez do trabalho. Eu amei ouvir esse pessoal cantar”, escreveu por email, agradecendo o convite de recitar o poema para Nicinha na abertura do vídeo.
“Gestamos e parimos um trabalho coletivo para homenagear tantas pessoas que perderam familiares e amigos nesses tempos de muita tristeza. Também homenageamos pessoas que foram importantes na nossa trajetória”, resume Marcel Gusmão. Ele destaca o arranjador Marcos Leite e o maestro José Pedro, falecido há exatos 20 anos num acidente de carro e homenageado nesta semana, em São Leopoldo.
Durante a realização do projeto, os integrantes que vivem em diferentes lugares do Brasil, dialogaram por meio de um grupo de whatsapp, que lotou de depoimentos emocionados ao longo do processo, especialmente hoje. “Linda nossa primeira viagem por esse Mar de Vozes! Parabéns a todos!”, escreveu Vera Novak, que mora em São Paulo. “Achei o máximo. Me senti renovada, voltei no tempo e me atualizei também. Amigos, foi demais, uma beleza, agradeço a cada um de vocês!”, comentou Maria Ângela Groth, que vive no Vale do Sinos.
“Não canso de ver! O som é lindo! A memória se vai, escutando isso. Aos bons tempos de coral Unisinos, uma das experiências mais especiais que tive na vida. A união de vozes que se transformam numa harmonia tá linda e emocionante. Mais uma vez obrigada!”, se emociona Marli Ludwig Souza. “Uma lindeza de música por um grupo de vozes que, em algum lugar do passado, já esteve lado a lado encantando corações”, relembrou o tenor Fernando Maynard.
“Muito emocionada ao ver a nossa estreia. Foi feito com tanto carinho”, registrou a soprano Janete Vargas, que segue cantando em outros projetos musicais. “Cantar e seguir cantando juntos mesmo estando longe. Cantar e seguir pulsando juntos, mesmo em tempos de pandemia. Cantar e seguir resistindo juntos, mesmo em tempos de autoritarismo e fascismo”, conclui o texto do vídeo.https://www.youtube.com/embed/wM4COz9j-fE?rel=0
Obra publicada pela Expressão Popular é a edição do Clube do Livro do mês de janeiro
RedaçãoBrasil de Fato | São Paulo (SP) | 29 de Janeiro de 2021.
As inquietações, dúvidas e análises que passaram pela cabeça de Karl Marx após o início de seus estudos econômicos em meados do século 19 podem ser encontradas na obra Cartas sobre o Capital, publicada em português de forma inédita pela editora Expressão Popular, que completa 22 anos de existência neste 29 de janeiro.
Além de aspectos da trajetória do filósofo, economista e historiador, a obra apresenta um acervo com informações detalhadas do processo de pesquisa e elaboração teórica de Marx.
O livro também reúne contribuições de Friedrich Engels durante a elaboração e publicação das obras que se tornaram referências mundiais como a Contribuição à crítica da Economia Política, de 1859, e o primeiro livro de O Capital, de 1867.
Cartas sobre o Capital, a obra do Clube do Livro do mês de janeiro, apresenta também as correspondências dos dois teóricos entre si acerca do materialismo dialético e retrata, ainda, as dificuldades enfrentadas por Engels para a reorganização e publicação dos manuscritos de Marx que compõem os livros II e III de O Capital.
A apresentação da obra é escrita por José Paulo Netto, professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e um reconhecido intelectual marxista brasileiro.
De acordo com a editora Expressão Popular, as primeiras seleções e publicações das cartas são antigas e raras. Além do primeiro lançamento em 1948, a última edição francesa, por exemplo, é de 1976.
A publicação em inglês aconteceu apenas sete anos depois, em 1983, mesmo ano em que uma edição foi publicada em Cuba.
O livro traduzido pela primeira vez em língua portuguesa recebeu um tratamento editorial diferenciado das demais publicações e conta com mais cartas, com revisão de equívocos das edições existentes e com a inclusão de novas notas explicativas que se referenciam nas obras mais atualizadas sobre o tema disponíveis no Brasil.
A nova edição inclui as cidades de origem e de destino das cartas, possibilitando a compreensão mais precisa do tempo e espaço em que foram produzidas as análises, assim como seu alcance. Tais informações não constam, por exemplo, na edição francesa e cubana.
As inscrições são gratuitas; escritores podem concorrer com obras inéditas nas categorias Conto e Romance
RedaçãoBrasil de Fato | Recife (PE) | 29 de Janeiro de 2021.
O Prêmio Sesc de Literatura, um dos mais importantes do país e consagrado na distinção de escritores inéditos, abre inscrições na próxima segunda-feira (1º). Obras ainda não publicadas podem ser inscritas nas categorias Romance e Conto. Os interessados têm até 19 de fevereiro para concluir o processo de inscrição, que é gratuito e online. O regulamento completo pode ser acessado no site do prêmio.
Os vencedores têm suas obras publicadas e distribuídas pela editora Record, com tiragem inicial de 2 mil exemplares. Desde a sua criação, em 2003, mais de 16 mil livros foram inscritos e 31 novos autores foram revelados.
Os livros são inscritos pela internet, gratuitamente, protegidos por pseudônimos. Isso impede que os avaliadores reconheçam os reais autores, evitando qualquer favorecimento. Os romances e contos são avaliados por escritores profissionais renomados, que selecionam as obras vencedoras pelo critério da qualidade literária.
No ano passado, os vencedores foram Caê Guimarães, do Espírito Santo, na categoria Romance, por ‘Encontro você no oitavo round’; e Tônio Caetano, do Rio Grande do Sul, na categoria Conto, por ‘Terra nos Cabelos’. O resultado reafirmou o aspecto de diversidade do projeto em descobrir talentos de todo o país.
Nesses 17 anos de prêmio, diversos autores foram descobertos e se consolidaram na literatura nacional graças ao incentivo da instituição. Entre eles, estão Juliana Leite, Rafael Gallo, Luisa Geisler, André de Leones, Franklin Carvalho, Sheyla Smanioto e Lucia Bettencourt.
A teoria revolucionária marxista é uma teoria da organização, da racionalidade dirigida ao humanismo, e não de uma rebeldia gratuita. Nela, cada sujeito assume um trabalho conforme sua disposição dentro de um amplo painel de ações necessárias. Somente desse modo, é que o primado da multidão proletária pode se consolidar e promover a emancipação conjunta.
Nesse panorama, obviamente, o artista tem uma tarefa fundamental. É dele a obrigatoriedade de promover a percepção totalizante e sensível do real junto aos afetos mais agudos de um povo, a fim de que, através de sua manifestação, possamos tornar mais claras e entusiásticas as nossas vias de mudança.
Talvez seja esse direcionamento que nos falte no momento pandêmico e no caos político que nos cerca. Nossos artistas, envoltos como estão no ritmo célere informacional, fazem intervenções midiáticas importantes e de notável ajuda. Porém, isso é o que fazem como indivíduos. Em sua condição orgânica de classe, o conteúdo de sua missão permanece vago, ou à espera de sua forma. Não temos ainda a canção nem a prosa exata que nos leve ao novo caminho.
Está mais do que na hora do artista assumir sua missão. Que perfure as bandeiras do fascismo com sua arte, isso é tudo que se espera dele. E o momento é agora. Há muito não eram tão necessárias outras formas de sentir o mundo.
*Victor Leandro é filósofo, escritor, analista-político, doutor e professor da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
Um dos estilos musicais mais criminalizados do país se tornou principal meio de divulgação e conscientização da vacina
Gizele MartinsBrasil de Fato | São Paulo (SP) | 27 de Janeiro de 2021.
MC Fioti, que há anos faz sucesso pelas favelas e periferias de todo o país, lançou no final de semana o clipe musical intitulado de ‘Vacina Butantan’, e em poucas horas teve mais de 1 milhão de visualizações. O episódio fez desse estilo musical — que há décadas é um dos mais criminalizados do país — se tornar uma das principais formas de comunicação entre a ciência e toda a população brasileira, divulgando a descoberta e a importância da vacina contra a Covid-19.
Ter o funk, um ritmo musical que vem dos becos das favelas com esse reconhecimento, é um alento para nós que lutamos dia a dia contra a criminalização e o racismo diariamente, ainda mais quando se trata de um país que cada vez mais tem como regra a retirada de qualquer tipo de direito, principalmente quando se trata dos mais pobres, favelados, periféricos do país.
Em 2020, assim que a pandemia dominou o país, foram as favelas e periferias que também deram o recado em organização, trabalho comunitário, cooperação, comunicação e apoio mútuo. Isso é fazer política no chão e na prática. No Rio de Janeiro, por exemplo, foram os movimentos de favelas e periferias e comunicadores comunitários que se organizaram e produziram formas de comunicação sobre as regras sanitárias. Foram os coletivos desses locais que passaram a buscar apoios para a compra de alimentos, máscaras e álcool 70%, além de produzir dados sobre o número de infectados e mortos para que a população estivesse sempre bem informada.
Tais ações demonstram o quanto a favela, a periferia, o quanto esse espaço tão criminalizado pelos governos e toda a sociedade consegue se organizar para sanar os impactos e a própria falta de direitos. As ações que ocorreram na favela no ano passado foram feitas porque já sabíamos que seríamos nós, novamente, que não teríamos qualquer tipo de comunicação sobre a covid-19. Sabíamos que o desemprego iria atingir altas taxas e que nós não teríamos nem mesmo comida.
Chegamos a este momento da pandemia sabendo que somos nós quem segue sem qualquer tipo de direito ao isolamento. Nem água para lavar as mãos temos. O fato é que não queremos mais lutar incansavelmente para sanar os impactos da falta de direitos. Nós queremos que todos os direitos sejam garantidos e distribuídos igualmente, porque, enquanto não houver essa divisão por igual, seremos nós a perder vidas.
Para finalizar este artigo, digo que a favela é e sempre foi uma solução para a falta de direitos, seja para a falta de moradia, de atendimento básico à saúde, de água, de comida ou comunicação. A favela é uma grande solução, seja quando temos o funk como a principal forma de divulgação sobre a vacina, num momento em que temos um governo de extrema direita que dissemina inúmeras fake news, ou quando temos a organização feita por comunicadores comunitários das favelas com campanhas para a busca de alimentos, divulgação de regras sanitária, ou mesmo para afirmar sempre que a favela também é cidade, que nós existimos!
A cantora carioca Maria Marcella lança o seu segundo álbum, Dentro D`Água (Kuarup), no qual presta tributo à obra de Dori Caymmi.Por Aquiles Rique Reis -26/01/2021.
O canto de Maria
por Aquiles Rique Reis
A cantora carioca Maria Marcella lança o seu segundo álbum, Dentro D`Água (Kuarup), no qual presta tributo à obra de Dori Caymmi. Um trabalho fascinante que acrescenta às melodias – Dori é craque ao manejá-las – versos dos parceiros Paulo César Pinheiro, Chico Buarque e Nelson Motta.
Maria empresta a essas canções sua voz poderosa de soprano com alcance de contralto (ela tem licenciatura em música pelo Conservatório Brasileiro de Música), e, por vezes, deixa aflorar a sua veia de cantora lírica. Mas não só, claro, já que ela também se vale de recursos de cantora popular para bem sagrar os (en)cantos gerados por Dori em suas criações.PUBLICIDADE
A sonoridade do canto de Maria dá a força que um álbum com músicas de Dori pode alcançar. Para isso, temos direção musical, arranjos, violão e voz de Dori Caymmi, produção de Marcelo Melo com o baixo acústico de Zeca Assumpção e a percussão de Edgar Araujo, gravação, mixagem e edição de Sérgio Lima Netto e Marcelo Melo, e masterização de Sérgio Lima Netto.
A mixagem, e posterior masterização, prioriza o som do violão, dando ao baixo acústico e à percussão a incumbência de fazer das músicas uma deliciosa e inspiradora criação minimalista. Com a sábia escolha pelos arranjos de Dori, Maria Marcella pôde passear seu cantar poderoso por cada uma das treze músicas do disco… e ela dá um verdadeiro show de interpretação.
Parece até que ela está “brincando” de cantar para amigos, em casa. Esta espontaneidade nos faz crer que ela é uma intérprete nascida para cantar as músicas de Dori. E isso não é pouco, não. Pois estou certo de que quem canta as músicas do baiano como ela cantou, cantará, e bem, qualquer música tão “complexa” quanto as de Dori Caymmi.Leia também: Orquestra homeangeia São Paulo com clipe “Raízes profundas”
Com linda intro do violão, Maria Marcella, irrepreensível, traz a bela canção “Água do Mar”. Em seguida, vem a clássica “De Onde Vens” (Dori e Nelson Motta) – a voz de MM cresce com o soberbo violão de Dori. Em “Delicadeza” (Dori e PCP), a voz de Maria revela seu timbre um pouco mais empostado, lindo! “Sombra”, “Saudade do Rio” (um louvor à cidade dos cariocas), e a belíssima “Rio Amazonas”, também são de Dori e PCP. E vêm a poética “Fora de Hora” (Dori e Chico Buarque) e novamente outras duas de Dori e PCP: “Dança do Tucano” – quando se nota bem o baixo e a precursão –, e “Armadilhas de Um Romance”, um lindo choro.
E tem mais, Dori Caymmi canta cinco músicas junto com Maria Marcella (aliás, a voz de Dori a cada dia fica mais bonita). Nessas ocasiões, os dois recriam “Voz de Mágoa”, Água do Mar”, “Dia de Graça”, “Rio Amazonas”, “Saudade do Rio”, as cinco de Dori e Paulo César Pinheiro, bem como “Saveiros” (Dori e Nelson Motta) – músicas estelares com originais concepções instrumentais e vocais.
É inusual uma jovem cantora escolher um repertório de excelências que se amolde tão corretamente à sua voz e à sua alma como fez Maria Marcella. A partir daí, tudo nos dá certeza de que cada música do álbum Dentro D`Água será admirável.
Obra reúne memórias dos 108 dias em que a artista passou presa sem provas na Penitenciária Feminina de Santana
Lu SudréBrasil de Fato | São Paulo (SP) |Janeiro de 2021.
A arte e a escrita possibilitaram a artista e publicitária Preta Ferreira a sobreviver aos 108 dias em que permaneceu presa sem provas na Penitenciária Feminina de Santana, em São Paulo.
Liderança do movimento de moradia, Preta e outros integrantes do Movimento Sem Teto do Centro (MSTC) foram acusados de extorsão e associação criminosa por supostamente coagir moradores a pagarem taxas nas ocupações na cidade de São Paulo.
Entretanto, nenhuma prova foi apresentada ao longo de todo o processo, ao qual a ativista ainda responde em liberdade.
As reflexões sobre as injustiças do sistema prisional e as vivências com outras mulheres privadas de liberdade estão publicadas no livro Minha carne: diário de uma prisão, lançado pela Editora Boitempo. A obra está em pré-venda.
“Escrevi esse livro para que as pessoas sentissem como é a dor de ser presa injustamente. Não é um livro que escrevi enquanto estive em liberdade, mas sim narrando todos os dias como é ser preso injustamente e o peso que essa injustiça traz no contexto social e na cor da nossa pele”, afirma Preta Ferreira em entrevista ao Brasil de Fato.
Além dos manuscritos da produtora cultural, a obra conta também com letras de música, poesias e participações especiais de nomes como Angela Davis, Conceição Evaristo e Carmem Ferreira.
As condições precárias e estruturais do cárcere também são denunciadas pela ativista.
“As pessoas estão sendo presas não para cumprir pena, mas para serem torturadas. Tem presídio em que não há condição de vida, com comida que chega com rato. Quem consegue comer isso? Passei três noites e três dias dormindo no relento, sem tomar um gole de água, sem comer nada. Isso é uma prisão ou é uma tortura?”, questiona Preta.
Brasil de Fato – De onde surgiu a ideia de escrever o livro e como foi sua passagem pela Penitenciária Feminina de Santana?
Preta Ferreira – Eu sempre tive uma relação muito boa com a escrita, mas o que me motivou a escrever esse livro foi o desejo de não me silenciar. Era uma forma de poder gritar, de poder gritar junto com vocês que gritaram aqui fora pelas liberdades pretas.
Escrevi esse livro para que as pessoas sentissem como é a dor de ser presa injustamente. Não é um livro que escrevi enquanto estive em liberdade, mas sim narrando todos os dias como é ser preso injustamente e o peso que essa injustiça traz no contexto social e na cor da nossa pele.
Sabemos que o que está prendendo pessoas pretas no Brasil é o racismo. Escrevi esse livro porque não queria perder nada do que vivi naqueles dias. E eu sabia que muitas pessoas iam me fazer essa pergunta de como é viver na prisão e quis escrever para que eu não perdesse nenhum daqueles dias, para que nenhum pensamento se esvaísse, porque as pessoas precisam saber como é ser presa injustamente e conhecer as falhas do sistema prisional que está aí para matar pessoas pretas.
Você imaginou que ficaria tanto tempo detida?
Quando me levaram da minha casa, irregularmente porque não apresentaram nenhum documento, não trouxeram nenhum mandato, o mandato que tinham era somente de busca e apreensão. Me levaram pra dar um depoimento. Como eu não devia e não devo nada pra ninguém, eu fui. Temos que colaborar com a Justiça.
Eu fui e até hoje continuo “dando esse depoimento”. Estou de habeas corpus, haverá um julgamento com acusações de um crime que eu não cometi. Praticamente pegaram o Código Penal e jogaram nas minhas costas e dos meus familiares.
Como sempre digo, são essas pessoas que têm que arranjar provas de que eu cometi crimes. Mas não cometi crime nenhum e disso tenho certeza absoluta. Sempre gritei e vou continuar gritando que sou inocente.
Preta Ferreira: “Sempre gritei e vou continuar gritando que sou inocente” / Foto: José Eduardo Bernardes/Brasil de Fato
Passei 108 dias presa injustamente, sem a presunção da inocência, com minha família sendo perseguida. Uma perseguição política. Somos lideranças do movimento de moradia de São Paulo, onde as pessoas foram presas sem nenhuma prova.
Minha mãe ficou foragida, minha irmã também. Eu e meu irmão ficamos presos injustamente. Fomos acusados de diversos crimes sobre os quais não havia provas. Meus advogados só tiveram acesso ao processo quase um mês depois para saber por que eu estava sendo presa.
Criminalizar todos os movimentos sociais que lutam por direitos constitucionais, sabemos que foi um plano de campanha de João Doria junto com Bolsonaro. Criminalizam esses movimentos para tirar a culpa de si, pra dizer que não é o governo que não cumpre com os direitos constitucionais.
O movimento social existe pela incompetência dos governantes, mas acaba sendo criminalizado por exigir um direito que é básico e constitucional. Eles estão invertendo a lógica.
Quais os principais sentimentos retratados no livro e quais eram as condições objetivas para essa produção?
Eu senti muita coisa quando estive presa injustamente. Senti ódio… senti não, ainda sinto porque sou um ser humano. Ódio, raiva, pena. De mim não mas de outras pessoas. Senti muita coisa, um mix de sentimentos que oscilam mas recebi muito amor também.
E houve muito um lugar de escuta das mulheres. Isso foi bom, me levou a conhecer outras coisas.
A minha relação com a escrita é desde a infância. Chegou o momento em que eu escrevia muitas caras e muitas respostas não chegavam, então descobri que minhas cartas não estavam sendo entregues.
Mas queria escrever que não perdesse nenhum dia, para ser fiel ao que estava vendo, vivendo e sentindo. O processo de escrita baseou-se em trazer a verdade.
E em relação às condições estruturais do cárcere?
As pessoas estão sendo presas não para cumprir pena, para serem torturadas. Tem presídio em que não há condição de vida, com comida que chega com rato. Quem consegue comer isso?
Passei três noites e três dias dormindo no relento, sem tomar um gole de água, sem comer nada. Isso é uma prisão ou é uma tortura?
Temos que olhar pro sistema prisional. A comida vem do interior, todos os dias. Por que vem do interior se as próprias mulheres podem cozinhar e ter redução de pena?
Não tem boa vontade dos governantes [com as pessoas presas] porque o plano é genocida. O plano é assassinar pessoas pretas. Prisões estão sendo construídas para que pessoas pretas sejam presas. É objetivo o plano deles.
O que mais podemos encontrar na obra para além dos relatos?
No meu livro tem poesia, música, roteiro. Tem muita arte. O que me salvou na prisão foi meu lado artístico. Sempre fui da arte, sempre trabalhei com a arte, que me possibilitou estar em outros lugares.
A arte me possibilitou enxergar o sofrimento com outro olhar. Existe arte nos presídios, mulheres artesãs e outras artistas. A bandeira que eu saí era uma bandeira feita de crochê, com os dizeres Marielle Presente. Existe música, pintura, crochê. O que a gente precisa fazer é criar oportunidade pra essas pessoas.
O que me possibilitou foi a arte, saber que não ia durar pra sempre. A minha fé também me possibilitou a enxergar que o sofrimento deveria ser encarado de uma outra forma. Aquele sofrimento não podia me derrubar porque tinha muita gente aqui fora gritando pela minha liberdade.
Busquei minha liberdade na arte. Fui livre de outras formas. Prenderam meu corpo mas aqui dentro, na minha cabeça, estava livre. É sobre isso: A arte significa também a liberdade.
Como foi a troca com as outras mulheres presas?
Encontrei diversos perfis, são muitas mulheres e diversas histórias. Mas o que leva as mulheres a serem presos, em sua a maioria, são os homens.
Vemos muito o feminicídio aumentando. Muitas mulheres foram para a prisão porque queriam se libertar, porque não queriam morrer nas mãos dos homens. Chegou a ponto de mulheres matá-los para sobreviverem. Elas denunciaram e nada foi feito.
Não queríamos que existissem mais “Marias da Penha” mas existem, infelizmente, porque não há lei que protejam as mulheres nesse país. O machismo, o feminicídio, o patriarcado. É isso que está levando as mulheres a serem presas.
E elas te ajudaram de alguma forma no processo de criação do livro, seja de forma objetiva ou como inspiração?
Com certeza todas elas me ajudaram porque a história também é delas. Não estou falando somente da minha prisão. Conto porque muitas delas foram parar ali porque são histórias verídicas, relatos que eu ouvi, presenciei, que estava presente.
Não conto só minha história porque não é só a Preta Ferreira que é injustiçada. Existem outras pessoas presas injustamente e precisamos contar essas histórias. Por isso conto as histórias das mulheres que cruzaram meu caminho.
A realidade que você encontrou corresponde ao perfil da população carcerária registrado por dados oficiais, de um maior encarceramento de mulheres negras?
Tem coisas que os dados nos mostram, que eles não veem. O universo é bem pior do que a gente imagina e do que pensamos. Os dados não mostram sentimentos. As mulheres e pessoas que foram presas injustamente têm que começar a gritar.
É isso que vai trazer a realidade. Minha carne tem esse propósito.
O título da obra realmente é muito forte e chama atenção, convoca uma reflexão. Qual o significado e a mensagem que ele carrega e transmite?
Só quem poder retratar algo é quem está sentindo. Então retrato em Minha Carne tudo o que o povo preto sente, tudo o que o povo preto passa, tudo o que vivem essas mulheres que cruzaram meu caminho.
Descrevo Minha carne com o que eu senti, com o que eu vivi, é a minha carne. Quando eu falo pessoas pretas livres é sobre isso, sobre essa carne, sobre esse povo, sobre essa população morta e perseguida. O povo preto, o povo indígena.
O que sinto em Minha Carne estou desenhando para que pessoas que não tem a possibilidade de sentir isso pela cor de sua pele, para que pessoas brancas que não vão sentir isso, entendam. Para que elas saibam como é sentir isso na carne todos os dias.
Temos que começar a falar sobre porque aquelas pessoas foram parar ali. Vejo que temos que começar a explicar. Fomos criados em uma sociedade em que a pessoa que foi presa um dia nunca vai ter a possibilidade de um recomeço.
Eu vivo em um mundo em que as pessoas vão procurar emprego, o que é solicitado não é o currículo, é o antecedente criminal. Como vamos chamar essas pessoas de reeducandas se elas nunca tiveram oportunidade? Como reinserir na sociedade quem nunca foi inserido?
Precisamos falar sobre o mundo do cárcere e que pessoas estão presas injustamente. Pessoas pretas e pobres. O direito de ir e vir está sendo retirado.
Se eu não contar, as pessoas não vão entender. Se eu não abrir a boca, vai ser mais uma forma de me silenciar. Eu tenho que encorajar outras pessoas para que elas também falem e gritem.
Do ponto de vista da sua trajetória pessoal, o que significa o lançamento do livro?
Significa vitória e liberdade. Realmente é um diário, não tem como dizer que as histórias não são reais. Tem as datas, os manuscritos. Então, lá atrás estava com um papel narrando toda a minha dor e hoje estou gritando por mundo para que ele entenda o que eu e outras pessoas estamos passando.
Minha carne é um grito de liberdade. E não tem só o simbolismo de vitória e conquista. É o sinônimo de liberdade. Significa que todos nós somos livres e precisamos falar.
Como é seu cotidiano, sua vida, depois que deixou a penitenciária e seu caso ter ganhado uma repercussão tão grande?
Eu saí muito mais forte. Agora, com o livro, as pessoas vão ler e muitas outras bolhas serão furadas. Esse livro também podem ser usados nas academias para que as pessoas saibam como funciona o sistema penitenciário de dentro.
Eu falo sobre necropolítica, sobre o genocídio, sobre indígenas, sobre a construção atual deste país. Tem carta do Papa Francisco, de Angela Davis, Erica Malunguinho. É um livro de cunho político, não se trata apenas de uma denúncia. Não se trata somente de relatos do que eu vi.
Esse livro e minha história estão alcançando lugares que eu jamais alcançaria. Houve uma transformação, uma reverberação do que foi a prisão.
Não deixei as pessoas me olharem como se eu fosse uma coitadinha porque não sou. Eu sou uma mulher de luta. Não quero que ninguém me veja como coitada porque fui uma mulher preta presa injustamente porque existem outras também sendo presas.
Temos que falar sobre todas. O livro me possibilitou a enxergar a vida com outros olhares e lugares, mostrar que precisamos dialogar com todo mundo.
Quais participações encontraremos no livro e como funcionaram essas colaborações?
Temos Juliana Borges, Erica Malunguinho, a doutora Aline Andrade, minha advogada, Maria Gadú, Angela Davis, Carmen Silva e Conceição Evaristo, que enquanto estive presa fez um poema pra mim.
Todas essas mulheres incríveis. Elas representam muitas coisas. Quis juntar um pouco de cada segmento. Elas, pra mim, são heroínas. Não que as outras não sejam, mas essas tem um significado especial.
Elas sentiram, viveram, presenciaram. Estiveram comigo. A descrição sobre o sentimento do livro é diferente.
A Erica Malunguinho fez um texto incrível na capa. Aí vem Angela Davis, Maria Gadú, Carmen Silva, que é minha mãe, a doutora Aline comentando e fechamos com o poema de Conceição. A última página do livro, está incrível.
Tem também a carta do Papa Francisco, do Lula. Tem uma história muito engraçada envolvendo essa carta do Papa. Eu escrevi e uma guarda riu da minha cara quando foi entregar. Lá não há privacidade pra nada. As cartas são lidas. E zombaram de mim.
Hoje estou aí, mostrando a carta do Vaticano que eu recebi, do Papa Francisco. Temos que fazer com que as pessoas criem possibilidade de sonho, que acreditem nos seus sonhos. Eu quero dizer que não estava louca naquela época e não estou agora (risos), eu recebi uma carta do Vaticano. É sobre isso.
Você foi solta após o habeas corpus. Ainda há algumas limitações no seu dia a dia?
Todos os meses tenho que ir ao Fórum assinar a minha carta de alforria, é assim que eu chamo. Mas não comecei ainda por conta da pandemia.
Qual a perspectiva pro julgamento do caso, considerando também toda a repercussão do caso?
Eu tenho certeza absoluta e plena da minha inocência. Estamos vivendo em um país em que a Justiça tem seletividade. Temos um presidente no país que faz as mesmas coisas que fazia em 1964, houve tortura, como ele mesmo diz.
Eu fui presa injustamente, tem liderança sendo mortas, Marielle foi assassinada. De qual Justiça estamos falando? A Justiça que eu acredito é a divina porque ela não falha. Temos que acreditar na Justiça que Deus move para colocar o homem como um provedor dessa Justiça para todas as pessoas.
É isso que eu espero da Justiça: que ela seja justa, nada mais e nada menos. Que ela seja justa. Presa durante esse tempo todo eu já fiquei, agora eu quero Justiça.
Você tem planos de retornar à penitenciária e mostrar o resultado da obra para outras presas?
Sim, tenho contato com elas ainda. Vão receber os livrinhos delas. Estamos com projetos bacanas. Quando se fala de criar oportunidade temos que criar realmente oportunidades.
Quero que o livro chegue aos presídios femininos para que as mulheres saibam que ali não é o fim da linha. Elas têm que passar por aquilo mas saber que existe esperança.
Agremiação completa 100 anos sem poder sair às ruas. Cancelamento da festa afeta artistas e trabalhadores informais
Afonso BezerraBrasil de Fato | Recife (PE) | 23 de Janeiro de 2021.
Ele tem a chave do carnaval de Olinda. O Cariri Olindense é um dos blocos mais tradicionais da cidade e comemora em 2021 100 anos de fundação. O marco, por si só, exige uma festa de grandes proporções.
Por causa da pandemia do coronavírus, o carnaval foi cancelado e, com isso, a agremiação vai celebrar o centésimo ano de atividade de um jeito diferente.
A mudança no formato da edição, ainda que por uma razão sanitária, mexeu com o emocional de quem dedica a vida inteira ao carnaval e também atua na cadeia produtiva da festa.
Foi o caso de Alexandre Gomes, 40. Ele trabalha como motorista. Nas horas livres, ele assume outra função, da qual tem muito orgulho: ele é porta-estandarte de quatro blocos de Olinda. Um deles o Cariri Olindense, onde iniciou a carreira de folião.
Foi aos 15 anos de idade ele teve a oportunidade de conduzir os símbolos do bloco. De lá para cá, dedica-se com afinco ao carnaval. Todo ano produz com as próprias mãos a sua fantasia e os detalhes do estandarte.
“Eu cheguei ao Cariri como ajudante de pedreiro durante a construção da sede. Aceitei a proposta, entrei no bloco e nunca mais saí”, relembra.
“Pra mim, seria um ano muito especial porque sou eu que estou produzindo o estandarte do centenário do Cariri. Não vou poder mostrá-lo ao público, nas ruas, né?”, lamenta.
“É uma tristeza, porque era o ano, na verdade, do Cariri. É uma data emblemática para qualquer agremiação, para qualquer atividade, para qualquer instituição completar 100 anos”, conta Hilton Santana, diretor de comunicação do Cariri.
Tradição é transmitida de pai para filhos em Olinda. / Arquivo pessoal
Impacto
O Carnaval de Pernambuco movimenta uma extensa cadeia negócios e garante renda para muitos trabalhadores. O cancelamento da festa representa um triste impacto para artistas, dirigentes e trabalhadores.
Buguinha Dub, produtor cultural e engenheiro de som, revela que neste período do ano sua agenda já estaria lotada:
“Essa época a gente já teria uma agenda de palcos de carnaval, já estaria trabalhando com a pré-produção também de alguns eventos, palcos, agremiações, prévias. Ou seja, a essa hora, já estaríamos produzindo o carnaval”, destaca.
O cancelamento do Carnaval apenas acentuou a crise que a pandemia gerou entre os artistas e os trabalhadores, setores diretamente afetados.
Juliana Serreti, dirigente do bloco Elefante de Olinda, outra importante agremiação da cidade, concorda com a decisão do Governo do Estado, mas revela o impacto negativo no trabalho de uma série de profissionais fundamentais para a realização da festa.
“Tem toda uma cadeia de trabalhadores da cultura, que já são vulnerabilizados, porque via de regra são ofícios que não são reconhecidos, não tem carteira assinada, já vem de um lugar de precariedade, e esse lugar de precariedade, mesmo com o carnaval, ele já é muito difícil. E aí, sem o carnaval, as pessoas ficam sem perspectiva”,
O Carnaval de Pernambuco movimentou, em 2020, aproximadamente R$ 2 bilhões, com a presença de mais de 2 milhões turistas.
Esta intensa circulação num curto espaço de tempo favorece a construção de uma espécie de poupança para os trabalhadores informais que, improvisando novos formatos de negócios, faturam valores que eles não alcançam fora do período da festa.
“É onde o comerciante informal ganha um dinheiro extra. Por que um dinheiro extra? Porque a economia dele vem além do que ele ganha no dia-a-dia durante o mês”, conta Edvaldo Gomes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Comércio Informal.
Poder Público
Tanto os artistas quanto os trabalhadores informais esperam que as prefeituras acionem algum tipo de incentivo para atenuar o efeito da ausência do Carnaval.
Em nota, a Prefeitura de Olinda informou que o “cancelamento do carnaval é uma perda grande para a cidade porque gera emprego e renda para milhares de pessoas, mas, seguirá todos os protocolos estabelecidos pelo Governo de Pernambuco acerca do cancelamento da Festa”.
A administração municipal disse ainda que “lançará mão de todos os esforços, no sentido de pleitear junto ao Estado suporte para os atores que fazem o Carnaval de Olinda.
Já a Prefeitura do Recife informou, também por meio de nota, que no momento está fazendo uma série de estudos e escutas com os principais segmentos envolvidos com o Carnaval.
O texto destacou que “o objetivo é amparar a extensa cadeia produtiva e criativa, de agremiações, artistas e trabalhadores e trabalhadoras da cultura diretamente envolvidos na realização do maior ciclo festivo da cidade. O segmento vem apresentando sugestões e a Prefeitura estuda os caminhos possíveis
O financiamento coletivo do documentário “100 anos do Cariri, pode ser acessado no site Benfeitoria.com/cariri100anos.
Aos 26 anos, a cantora e compositora Marília Parente lança a canção-reportagem “Para La Tierra Volver”. Ela conta a história de camponeses jurados de morte e em situação de conflito fundiário no Engenho Fervedouro, em Jaqueira, na Zona da Mata de Pernambuco.
Pouco difundido no Brasil, o termo canção-reportagem, segundo Marília, é a narração musical de fatos ou estórias.
“Na verdade nada mais é do que contar a história, os fatos, e transformá-los em canção. Bob Dylan tem isso com Hurricane, que conta a história de um boxeador. Narrativas que nem sempre são reais. Algumas são ficcionais, outras são reais. Essa narrativa que eu conto é real, pulsante e presente”, explica.
A história contada ainda está em curso e transformou a realidade da Zona da Mata Sul de Pernambuco. Uma lista com dez nomes foi divulgada de forma anônima, anunciando a morte de agricultores.
No Engenho Fervedouro (Jaqueira), cerca de 75 famílias posseiras vivem sob tensão e ameaças / CPT PE
De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, a região é apontada como o maior e mais perigoso caso de conflito fundiário no estado de Pernambuco em 2020. As famílias do Engenho Fervedouro e de comunidades vizinhas enfrentam o conflito com a empresa Agropecuária Mata Sul S/A, ligada a empresários do setor sucroalcooleiro e políticos.
“Eu pude ir lá, conversei com algumas pessoas da comunidade e descobri que tem uma lista de dez camponeses jurados de morte. Um desses camponeses jurados de morte se chama Edeilson, que levou sete tiros em uma emboscada, de moto. É assim que a música começa, contando a história dele, dessa emboscada. Ele era o primeiro dessa lista de pessoas juradas de morte e não morreu”, diz a cantora.
Apontado como o primeiro jurado de morte, o camponês Edeilson Alexandre sofreu uma emboscada em 16 de julho de 2020. Alvejado por sete tiros, as balas atingiram mãos, costas e nádegas. O agricultor sobreviveu, mas a comunidade vive a apreensão de que a situação pode se repetir a qualquer momento.
Essa é a primeira composição de cunho político-social de Marília, que pede solução para o caso / Hugo Coutinho / Divulgação
Jornalista pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) com passagem pelo movimento RUA, essa é a primeira composição de cunho político-social de Marília Parente, que diante do desmonte de políticas públicas do governo Bolsonaro e incentivo à violência contra camponeses, se viu na necessidade de contar a história por meio da música.
“Eu sou uma cantora que vem do forró, da música nordestina, do sertão, e aí passei para o rock’n roll, na doideira, na loucura, e aí depois eu me amansei. A realidade estava urgente demais para eu continuar na psicodelia, ela me empurrou para isso, eu fui empurrada a esbarrar musicalmente. E Edeilson é como eu falei em outra entrevista: se eles queriam ele morto, eu queria ele imortal”.
Pernambucana, a cantora reforça que a sociedade precisa cobrar solução para o caso, com a desapropriação da área e a garantia de segurança aos agricultores.
“É uma indignidade com o trabalhador que vive da terra, que nasceu, cresceu e vai morrer na terra. Não existe justificativa para isso, ainda mais em um terreno que deveria ser desapropriado, porque existe uma dívida ali. E a gente aguarda, enquanto sociedade civil, enquanto cidadãos, a resolução. A gente não pode conviver com esse tipo de violação”, destaca a compositora.
Além de Marília Parente, participam os músicos Antonio Nolasco, Rodrigo Padrão, Rodrigo Cm e Caio Wallerstein. A canção já está disponível nas plataformas digitais.
Eis um território esquizófico como desejo imanente atravessado pela Associação Filosofia Itinerante – AFIN. Um território movimentado por intensidades pulsantes. Eis um território esquizo de saberes encadeados como potências virtuais.
Território da poiésis, onde esquizo navega como conceito grego: divisão. Divisão como multiplicidade Ética/Estética/Política produtora de saberes e dizeres que escapam das armadilhas dos tirânicos conceitos dogmatizados.
Nada de divisão matemática e nem geométrica. Muito menos divisão como conceito esquizo da psiquiatria ortodoxa, que o estigmatizou como divisão psicótica da percepção e do entendimento manifestada em alucinações corporificadas como quadro clínico delirante no conceito normatizador da psicopatologia escrita no discurso da sociedade despótica capitalística.
Este território esquizófico, você, amigo internauta, está convidado a compor afetos que possam aumentar nossas potências de agir navegando com Fernando Pessoa, para quem “navegar é preciso” e o “necessário é criar”. Também com navegantes-poiéticos como Epicuro, Lucrécio, Spinoza, Maquiavel, Nietzsche, Marx, Bergson, Sartre, Foucault, Deleuze, Guattari, Toni Negri, Michael Hardt, Hannah Arendt, Beauvoir, Bárbara Cassin, Artaud, Van Gogh, Godard, Kafka, D.H. Lawrence, Becket, entre outras.
Aqui podemos compor bons encontros, mesmo quando as afecções pareçam más. Aqui tentaremos soltar o devir-louco. A intensidade criativa sofística tão ameaçante ao idealismo platônico com sua ordem ideal. Aqui, você, seja acessando, ou postando seus dizeres, atua como corpus que tece cartografias de desejos. Afinal, o desejo é uma enunciação coletiva produtora de comunalidade. E este Hiper-Corpo-Virtual pode muito bem servir de instrumento para esta produção.
Cartografemos esquizos saberes, pois!
“NÃO É APENAS DESENVOLVER INFORMAÇÕES,MAS EXPRIMIR POTÊNCIA…
Por que ter medo de perder-se no oceanos das informações? Sempre haverá uma informação que acrescente um valor à vida, um excedente que a impedirá de perder-se. Quando se navega na rede, surge não apenas o eterno paradoxo do infinito possível e da limitação do meio, mas uma outra tensão paradoxal: a de trabalhador explorado e do rebelde, do hacker, do sabotador: aqui há vida, irredutível, há astúcia e autovalorização. Desculpem a retórica filosófica: aqui estão Maquiavel e Marx”.